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João Távora

Uma última fita

É com alguma consternação que escrevo estas palavras. Ao cabo de dois anos e meio de “militância” no Corta-fitas vejo-me na contingência da minha despedida. Responsável principal pelo recrutamento do Paulo Cunha Porto para “esta casa”, vi-me ultimamente envolvido numa sucessão de absurdos e mal entendidos que me incompatibilizam com este projecto. Não por causa de qualquer “facção” mas antes por respeito comigo próprio.


Saio com amargura porque desde o princípio me envolvi muito nisto tudo – só por isso. De resto, espero sinceramente que o Corta-fitas ultrapasse esta pequena crise. Acho que para que tal aconteça terá que recuperar depressa os valores com os quais cresceu: tolerância, abnegação e espontaneidade.

Resta-me agradecer sinceramente a todos, leitores e “colegas de blog” os gratificantes momentos que gozei nesta aventura. Até sempre.

Santana Lopes: o antídoto da esperança


Carregado de razão está Pacheco Pereira ao clamar contra a escolha no PSD de Pedro Santana Lopes para candidato à Camara Municipal de Lisboa. Com mais ou menos justiça, mais ou menos inabilidade, Santana Lopes foi a face visível dos mais patéticos momentos da política nacional dos últimos trinta anos. Tendencialmente apreciado pelo jornalismo estabelecido, suspeito que também o é secretamente pelos adversários à esquerda, na expectativa dum caminho fácil rumo aos seus objectivos.


Com a Câmara Municipal de Lisboa em profunda crise, da qual nenhum dos partidos tem as mãos limpas, as eleições que se avizinham apresentam-se como uma oportunidade clara para uma desforra à direita. Assim, sendo estas uma das mais importantes eleições do regime, as candidaturas à presidência da CML deveriam ser levadas a sério pelos partidos da oposição, com escolhas de primeira linha, descomprometidas e de cadastro limpo. Com  autoridade para reclamar uma vida nova na gestão da capital do país. Se é que isso ainda é possível.

 O futebol às vezes é uma agonia *


Uma lástima a prestação nacional ontem em Braga contra a Albânia. O problema é que tratando-se de uma selecção de jogadores, esta está longe de ser uma equipa, não possui um sistema de jogo. Do que eu estou certo é de que o futebol não se joga de fato e gravata, e que por mais que se deseje, um treinador “de bola” não é um “gestor”. O que é mais trágico, é que com a saída de jogadores como Figo ou Rui Costa a selecção perdeu liderança dentro do campo.... e com a chegada de Queiroz perdeu-a no banco.  


 

* Palavras de Carlos Queiroz na conferência de imprensa

A crise perpétua

Quem tenha um pouco de memória sabe como em Portugal pelo menos há quarenta anos se apregoa uma infindável crise. Desde o choque petrolífero de setenta, passando à espiral inflacionista aos gloriosos dias do PREC, ainda sobrevivemos aos governos do Dr. Mário Soares com a ajuda de Paul Krugman e do FMI, "os ricos que paguem a dita!". Depois veio a crise dos anos noventa, o Cavaco a apanhar os cacos e os fundos estruturais, até despontarmos esfusiantes no oásis pré-expo '98 do Engenheiro Guterres. Depois dele, de novo vacas magras, o ataque às torres gémeas, novo choque petrolífero, o garrote do deficit orçamental, por aí afora até ao malfadado "sub-prime" que hoje nos aperta os calos.


A vida é difícil e a crise de cada dia é sempre pior que a anterior. E quanto se atormentavam os nossos pais e avós com as perspectivas profissionais dos seus filhos e netos! O espantoso é como afinal de contas nós sobrevivemos às malfazejas garras do destino de ser português, no desapiedado mundo contemporâneo. É que afinal à boa maneira portuguesa, a gente sempre se safa... até que a bolha um dia rebente de verdade.

A culpa é do cromossoma 20!


Temo bem que a recente descoberta cientifica do cromossoma responsável pela calvície (uma palavra que odeio) não venha a tempo de me acudir contra a aviltante tonsura que há já alguns anos alastra na minha cabeça. Sem que se compare com a careca do nosso insigne deputado Diogo Feio, eu que não sou homem de me olhar ao espelho, à conta disso já passei alguns vexames: por exemplo, há bem pouco tempo, quando uma senhora no prédio se cruzava nas escadas com o nosso filhote  de colo, exclamou condoída à mãe que a criança coitada, em matéria de cabelo aparentava sair ao pai!

Reflexões

Dramático é como em Portugal, um pequeno país tendencialmente iletrado e com pouca tradição democrática, o espectro ideológico se nos apresente tão afunilado. Nos “media” dominantes, no meio intelectual estabelecido, impera o pensamento uniformizado e cinzento, viciado em meia dúzia de lugares comuns. Os nossos escritores, políticos e jornalistas da moda raramente reflectem efectivas diferenças ideológicas, ou um pensamento original. Quase sempre as suas mais profundas divergências revelam-se tão só nas suas cores clubísticas, ou por meros caprichos de circunstância.


A efectiva democracia só existe se nela organicamente imperar a diferença.

E depois, ser democrata não deveria jamais ser um conceito vazio, uma abstracção, uma teoria; antes uma prática, um desafio vivido – exige maturidade, civilização.

O democrata ultrapassa os seus preconceitos, domina as suas emoções, e escuta, aceita o Outro. Mesmo que esse Outro seja adversário na disputa do seu mais  ansiado objecto. Numa civilização adulta, o pensamento e as ideias coexistem na sua diferença, de um extremo ao outro, sem preconceitos, sem amputações.

Livremente como se vai observando nalguma da boa blogosfera.

E o direito à diferença?


Enquanto esta manhã no parlamento o Partido Socialista executava mais uma hábil pirueta e promovia o “casamento” homossexual a imperativo debate nacional, ao mesmo tempo, a opinião regimental era doutrinada nas avassaladas rádios e televisões nacionais.


A Grande Parada está a começar, e o Grande Irmão prepara as mentes ignotas para mais uma fracturante revolução de costumes, rumo aos píncaros da civilização. É neste espírito que o programa Opinião Pública da SIC Notícias convidava esta manhã  o “insuspeito” Rui Tavares para comentar tão suculento tema. Coadjuvado pela apresentadora de serviço, o virtuoso pregador (necessita urgentemente de aulas de dicção, mas isso não interessa nada) escuta complacente o povo ignorante que teima não entender o sentido profundo da igualdade: que afinal o casamento de dois indivíduos do mesmo sexo se equipara por exemplo ao casamento de um homem e de uma mulher de raças diferentes.

Admitindo como inevitável a promulgação do “casamento” gay a breve trecho, apenas desejo realçar, como lamentavelmente a discussão nos grandes meios está inquinada, feita mera propaganda ou sound bite. Apequenando o pensamento e minando a democracia. Eu, em oposição ao simplismo igualitário, perfilho antes a causa do direito à diferença.

Chamem a polícia


 


Tive uma adolescência atribulada: idealista e rebelde, naqueles loucos finais de setenta, princípios de oitenta, protestei e prevariquei quanto me foi (ou não) permitido. Durante esses tempos “de crescimento”, estragos fiz que mais tarde consertei, mas suspeito que até ao fim dos meus dias verei nas ingratidões do mundo e nas insolências das minhas criancinhas todas as cobranças que se me ficaram por saldar.


Vem isto a propósito da Polícia, entidade que a sociedade hoje reclama em força nas ruas, mas que em determinada fase da minha existência ganhou para mim um indesejável protagonismo.

Desde cedo palmilhei a vida com bastante liberdade, e então, as “forças de segurança” passavam definitivamente ao largo dos meus dias: jamais me defenderam dalgum índio da rua, assim como nunca me embargaram uma bola de futebol. No fundo, para mim “o polícia” pouco mais era  do que aquele antipático personagem dos livros do Hergé.

Até que certa vez chumbei por faltas, fui vender enciclopédias e comprei uma ruinosa motoreta para me armar (imagino que nenhuma criação da engenharia do século XX teve tantas avarias em tão poucos anos) -  a minha vida não mais seria a mesma. Nesse mesmo dia, ao chegar a casa montado na reluzente geringonça, tinha um polícia à porta que me multou por falta duma reles licença camarária. Foi o meu primeiro embate com as “forças da ordem”. Dois dias depois, não resistindo à vaidade de levar uma amiguinha à pendura sem capacete, à terceira ou quarta curva, fui interceptado pelo mesmo guarda, e acabámos todos na esquadra do bairro. Ainda hoje desconfio que aquele tipo passou o tempo todo a rondar os meus caminhos para me apanhar em falta.

As noites loucas que se sucederam nos anos seguintes daquela emborbulhada existência trouxeram consigo algumas rusgas, correrias, e muitos amargos de boca. O pudor de pai de família e de cidadão cumpridor impede-me hoje de aprofundar muitas das desventuras então vividas. A certa altura comprei um Mini em 10ª mão, com o qual não conseguia atravessar a cidade sem que se avariasse ou eu fosse "parado" pela polícia, a viatura rebuscada e inspeccionada. O saldo da minha conta na rua de Sta. Marta chegou a tal ponto que tive que me desfazer do "boguinhas", e nem isso chegou para pagar dívidas.

As coisas depois ainda pioraram, mas isso já não interessa nada. O que me importa hoje constatar com alguma surpresa é que, há muitos, muitos anos que não sou interceptado ou multado pela polícia, que afinal pulula pelas estradas do país e pelas avenidas da cidade. Agora que tenho a consciência tranquila, automóvel certificado e impostos em dia, os zelosos guardas não querem nada de nada comigo. Até dá galo!

História de algibeira (33)


A instituição do descanso semanal obrigatório dos trabalhadores em discussão na Europa no final do Séc. XIX entrou na agenda política portuguesa em 1904. Então, os republicanos, com Teófilo Braga como protagonista, opuseram-se veementemente a tal prerrogativa, com o argumento de que: o descanço dominical, isto é, a morte de toda a actividade intellectual e fabril de um paiz, é o tédio ou a ruína. É o suicídio social para a gente fina que se diverte. Um domingo de Londres é, para os habitantes de Londres, o peor e o mais negro e húmido dos seus nevoeiros. Saiba mais aqui


 


Imagem: Calceteiros em obras municipais de Joshua Benoliel 1907 daqui.


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