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João Távora

O ópio do povo (28)

(...) O que me inveja não são esses jovens, esses fintabolistas, todos cheios de vigor. O que eu invejo, doutor, é quando o jogador cai no chão e se enrola e rebola a exibir bem alto as suas queixas. A dor dele faz parar o mundo. Um mundo cheio de dores verdadeiras pára perante a dor falsa de um futebolista. As minhas mágoas que são tantas e tão verdadeiras e nenhum árbitro manda parar a vida para me atender, reboladinho que estou por dentro, rasteirado que fui pelos outros. Se a vida fosse um relvado, quantos penalties eu já tinha marcado contra o destino? (...)

Mia Couto, in O Fio das Missangas

Venham mas é os "choques eléctricos"!

Hoje de manhã, tive de apanhar um “transporte alternativo” em substituição do metro para Avenida da Liberdade. Não vou perder tempo a contar o surrealismo da desorganização deste serviço... Mas acabei comodamente sentado à frente num autocarro de turismo, bem perto do condutor, um senhor de provecta idade, de bochechas coradas e tez curtida por muitos anos de sol mediterrânico.
Eis senão quando, ao final da Rua da Prata, nos sinais antes da Praça da Figueira, o condutor vira-se para os passageiros e pergunta com uma sinceridade desconcertante: “Esta carreira costuma ir por onde? Vira já aqui à esquerda nesta praça?”
Agora falem-me da banda larga, e dos choques tecnológicos que eu acredito!

Um merecido aplauso a Scolari

Muito se escreveu e disse a condenar e a julgar as opções deste homem. Scolari sempre me pareceu um líder forte e com bom senso. Aglutinador. Escolheu a sua equipa. Com legitimidade fez da selecção uma equipa, a nossa.
Agora é fácil dizê-lo, mas parece-me oportuno referir que só uma UNIDA equipa de alma ENORME teria aguentado os consecutivos assédios assassinos dos armada holandesa… Esse facto é consequência da sua liderança. É da responsabilidade do treinador. O que os nossos rapazes correram e como se desmultiplicaram!
A ver vamos até onde os nossos "Tugas" poderão chegar.

A Igreja que eu conheço I

Há dias declarava eu num comentário a um “post” do Nuno Sá Lourenço que tenho tido ao longo da vida a sorte de conviver com uma Igreja Católica as mais das vezes actuante, sóbria e valorosa, com leigos de uma generosidade infinita, e clérigos que se têm revelado para mim inspiração e testemunha de um caminho de vida em santidade. Nesse sentido, pareceu-me importante concretizar um pouco mais. Os exemplos com que me tenho cruzado são tantos que me é impossível listar e com justeza fazer referência a todas as pessoas e obras que conheço. No entanto, nestes tempos de descrença e desconfiança, parece-me de grande importância trazer à superfície alguns exemplos de heroísmo e excelência de cidadania que os “media” bem pensantes, por um ataviante pudor laico, teimam em ignorar.

Assumo a simpatia por esta igreja peregrina dos dias de hoje. Despojada do poder, mas muito mais consciente, evangelizada e com cariz de “contra-poder”. Talvez um pouco como no tempo dos primeiros cristãos. Esta Igreja, possuidora de uma mensagem revolucionária de libertação, cresceu e multiplicou-se sem protocolos vazios ou gratuitos formalismos. Hoje a evangelização é uma dura batalha a encetar pelos cristãos, que terão que pregar perante o ruído ensurdecedor desta cultura Neo-liberal do sucesso "a todo o custo" e lucro individual. Contra as trevas e alienação do imediatismo do consumo e do hedonismo individualista. Desagregador.
Em prol da felicidade e liberdade do homem, a igreja dos dias de hoje fornece cada vez mais activos grupos e movimentos de diferentes sensibilidades culturais e políticas. Das simples mas dinâmicas paróquias às comunidades de desenvolvimento espiritual e organizações de intervenção social, a igreja de hoje é um sério exemplo de pluralidade democrática e cidadania actuante. No entanto esta acção deverá ser apenas fruto da inspiração que para nós cristãos provém de uma mensagem muito clara: A realidade de Jesus Cristo, filho de Deus que entregando-se à morte por amor fraternal supera as trevas para sempre em favor dos homens. Estabelece-se o lugar da esperança. Esta é para nós a revolução. Paralelamente temos o segundo e fundamental o mandamento que distingue e caracteriza esta religião: Amai-vos uns aos outros como a vós mesmos. É neste exercício de aproximação ao divino que se deverá pautar a vida dos cristãos; acto de libertação só plausível pela relação aprofundada e exercitação espiritual de uma relação verdadeira com Deus.

A Igreja que eu conheço II

Como atrás descrevi tenho o privilégio de conhecer bem alguns exemplos vivos de autênticos heróis e heroínas da vida real e quotidiana. Indivíduos de acção, voluntários ou profissionais que num exercício diário de entrega e imitação de Cristo servem com todo o seu amor o próximo e a comunidade em que vivem. Nesse sentido parece-me da minha obrigação elementar dar testemunho em próximos posts de três exemplos que conheço bem de perto: O “Projecto Homem” da Associação Vale de Acór em Almada, do Padre Pedro Quintela e sua equipa, instituição criada para a recuperação de toxicodependentes por onde centenas de rapazes e raparigas já tiveram passagem libertadora. Outro será o projecto do nosso Padre Armindo, o sonho da reabilitação do Bairro do Fim do Mundo, na Galiza aqui na paróquia do Estoril, pela construção da Igreja e Centro Social de Nossa Senhora da Boa Hora.
Finalmente apresentarei os Casais de Sta. Isabel, iniciativa apadrinhada pelo Cónego Carlos Paes, prior da paróquia de S. João de Deus para a criação e desenvolvimento de equipas de catequese para casais “recasados”. Um projecto integrador da Igreja que somos nós, já disseminado em muitas “equipas” (uma das quais a minha mulher e eu orgulhosamente integramos) por este país fora.

Conheço estes três projectos de perto assim como algumas das pessoas que aí empregam as suas forças, o seu tempo e vontade, quando não quase toda a sua existência. E sei que há muitos e muitos mais. São milhares de vidas anónimas de pessoas que agem e se entregam diariamente pelos outros. Com muita devoção e oração superam as suas limitações, sem lamentos e sem descanso, numa imitação de Jesus Cristo em prol de um mundo melhor, mais digno, livre e justo. E rezam terços a Nossa Senhora, sim senhor! Como eu os admiro e invejo. Estes que me fazem todos os dias acreditar um pouco mais no homem e na religião que professo.

A mais bela bandeira do mundo III

Muito interessante tema abordado pelo João Villalobos aqui em baixo.
Uma bandeira impõe respeito pelo seu valor simbólico.
O seu valor simbólico está na sua história e na relação que cria com o povo (as pessoas) que a “assume” como tal.
O valor simbólico de uma bandeira tem a ver com a relação com o “sagrado”, com a “utopia”, com “valores maiores”. Para a valorização dos símbolos é urgente a nossa capacidade de “idealizar”.
Nesta época de dessacralização global, até aceito estas novas formas de utilização dos símbolos. Mesmo com patrocínio de empresas, será uma forma de "agregação", contrariando a tendência geral. É o que temos e porventura o que merecemos, novecentos anos depois.

Pensamentos do Dalai Lima IV

«Rápido», o adjectivo, conformou-se a exercer igualmente funções de advérbio, para não se ver colocado no quadro de supranumerários da Função Pública.

Nota: Post gentilmente cedido ao Corta-Fitas pelo autor e colocado durante o desafio México x Portugal!

Um olhar sobre a 9ª arte I

Na Travessa do Patrocínio, encontrávamos fascículos e volumes do Cavaleiro Andante, e tenho uma vaga ideia de uns álbuns da Bécassine. Na Avenida da Liberdade, era outra fartura: a fabulosa colecção de "Tintins" do Tio Duarte, e uns poucos de “Astérixes” da Tia Isabel, eram um fartote para os meus desejos de aventura e fantasia. Eram em francês, para o caso completamente indiferente pois eu não sabia ler. Um pouco mais tarde, em 1968, a revista Tintim editada pela Bertrand passou a ser presença semanal na nossa casa. Foi assim que a Banda Desenhada (BD) entrou na minha vida.
Hoje ainda possuo algumas obras de BD na minha biblioteca que aliás impinjo despudoradamente às minhas crianças. Considero a leitura de BD um acto cultural que em grande medida supera os benefícios de ver cinema ou animação. A mediação do prazer pelo trabalho mental do leitor em juntar as peças (quadrinhos) e dessa forma enquadrar-se numa acção imaginária e em movimento parece-me excepcionalmente saudável. A relação íntima e pessoal que se pode criar com os personagens está ao nível do possível na melhor literatura: o tempo é nosso e a vida do personagem é pelo leitor induzida. Não desfazendo, o autor no momento da leitura torna-se “apenas” num passivo “realizador e argumentista”. Nós temos o papel fundamental de fazer rodar as frames no nosso cérebro. E interpretar a mensagem. Ao nosso ritmo, com o nosso nível de profundidade.

Um olhar sobre a 9ª arte II

Com alguma dificuldade, muito matutei para eleger com gratidão os cinco personagens de Banda Desenhada que mais me marcaram a existência. Uma forma de homenagem ao seus autores que tantas horas de prazer me proporcionaram. E espero que um incentivo e algumas pistas a quantos não conheceram o prazer de vibrar com as histórias e aventuras destes “seres” quase vivos.
Em primeiro lugar, estará sempre o Tintim de Hergé. Meu companheiro de infância, de sonhos e brincadeiras. Do pequeno e inocente Tintim do Ídolo da Orelha Quebrada, passando pelo sofisticado Tintim do Carvão no Porão e acabando no adulto e contemporâneo Tintim do Voo 714 para Sydney.
Em segundo lugar o meu grande herói do Oeste, o insolente cowboy Lucky Luke de Morris & Goscinny. Realço o humor desregrado e delirante de Goscinny, também autor dos incontornáveis Petit Nicholas e Asterix.
Em terceiro lugar o meu pessoal e íntimo amigo de infância Spirou, o “grumete” de hotel. De Franquim. Não me esqueço do seu amigo Fantasio, que para mim representa o plausível leitor, companheiro do herói, sempre falível, leal e bem intencionado. E o fabuloso Marsupilami. Um animal que Deus teria por certo Ele próprio criado se não tivesse mais que fazer e criar, tudo naquela semana decisiva.
Em quarto lugar, mais crescidinho, apaixonei-me pelas aventuras de Olivier Rameau e Colombe Tiredaile de Greg. Nomeadamente por Colombe. Os meus infantis e primeiros passos conscientes na dimensão libidinosa da vida. E aqueles pequenos e malandrecos falos peludos os Pouyoutouffus… e o horroroso pássaro gigante com uma máquina de barbear na ponta do bico… lembram-se?
Em quinto lugar o anti-herói da minha pré-adolescência… Spirit de Will Eisener. O enigmático detective de Central City. Em quantas das suas aventuras este herói começa a acção entre caixotes do lixo vítima de uma brutal "coça"? A negritude dos anos 70 no seu melhor. Uma paixão.
É injusto não me referir a muitos outros personagens que marcaram as solitárias e íntimas horas de leitura da minha infância. Por isso vou mencionar os meus Príncipe Valente de Hal Foster e Homem Aranha de Stan Lee. Bom, mas já que estes são registos tão pessoais porque não hei-de falar do Cuto, de Jesus Blasco?

O ópio do povo (18)

Ontem por momentos senti-me um pouco angolano. Emocionei-me e vibrei e comovidamente com o empate de Angola com o México. E aquele abraço no final entre Figueiredo (que é branco) com Macanga, tão simbólico, fez-me acreditar um pouco mais… Foi a vitória da VONTADE, o mais importante "sentido" do homem.

Nota: Em contraste com o Pedro Correia, (na sua “guerra de civilizações” a propósito do México - Irão) nutro também uma especial antipatia pelo México. Um estado fundamentalista laico, que é o outro lado da miséria civilizacional. Não me esqueço como foi tratado João Paulo II na sua visita ao México em 1979.

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