Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

João Távora

Para bem da nossa auto-estima...

Assim como se aceita a inevitabilidade da realpolitik na relação entre estados, parece-me essencial que os nossos representantes logo ao jantar, entre sabujas mesuras e gulosos acepipes, não percam a oportunidade de afirmar o alinhamento político do Portugal democrático... por muita contrariedade que isso cause ao flanco “rebelde” do Sr. Pinto de Sousa. Isso para bem da auto-estima nacional, e para que ele não seja confundido com um qualquer Mahmoud Ahmadinejad, presidente do Irão e também muito “amigo” de Hugo Chavez.

Domingo

Evangelho segundo São Lucas 21, 5-19

Naquele tempo, comentavam alguns que o templo estava ornado com belas pedras e piedosas ofertas. Jesus disse-lhes: «Dias virão em que, de tudo o que estais a ver, não ficará pedra sobre pedra: tudo será destruído». Eles perguntaram-Lhe: «Mestre, quando sucederá isto? Que sinal haverá de que está para acontecer?». Jesus respondeu: «Tende cuidado; não vos deixeis enganar, pois muitos virão em meu nome e dirão: ‘Sou eu’; e ainda: ‘O tempo está próximo’. Não os sigais. Quando ouvirdes falar de guerras e revoltas, não vos alarmeis: é preciso que estas coisas aconteçam primeiro, mas não será logo o fim». Disse-lhes ainda: «Há-de erguer-se povo contra povo e reino contra reino. Haverá grandes terramotos e, em diversos lugares, fomes e epidemias. Haverá fenómenos espantosos e grandes sinais no céu. Mas antes de tudo isto, deitar-vos-ão as mãos e hão-de perseguir-vos, entregando-vos às sinagogas e às prisões, conduzindo-vos à presença de reis e governadores, por causa do meu nome. Assim tereis ocasião de dar testemunho. Tende presente em vossos corações que não deveis preparar a vossa defesa. Eu vos darei língua e sabedoria a que nenhum dos vossos adversários poderá resistir ou contradizer. Sereis entregues até pelos vossos pais, irmãos, parentes e amigos. Causarão a morte a alguns de vós e todos vos odiarão por causa do meu nome; mas nenhum cabelo da vossa cabeça se perderá. Pela vossa perseverança salvareis as vossas almas».

Da Bíblia Sagrada

Tributo à Bolacha Maria

Composição: Farinha de trigo, açúcar, gordura de palma, xarope de glucose, água, emulsionante, (lecitina de girassol), sal mineral, levedante químico (bicarbonato de sódio), agente de tratamento de farinha (metabissulfito de sódio) e glúten.
Valores nutricionais por 100 g: Valor energético: 1779KJ (421 Kcal) Proteína: 6,8g Glícidos 78,9 g, Lípidos: 8,7g.



Ainda as comprei ao quilo envoltas em farripas de papel, dispostas em caixas de cartão. Naquele tempo, pouco antes do advento dos supermercados, já havia uma variedade enorme de bolachas, em saquetas ou a peso. Vendiam-se numa qualquer mercearia ou charcutaria de bairro. Com recheio, sem recheio, d’Araruta, de Baunilha, Belinhas, Torrada, de Areia, Água e Sal, Línguas de gato, de veado ou da sogra, etc., etc., etc.
Mas as “bolachas” mais “bolachas” de todas; mais saborosas e que porventura eu levaria para uma ilha deserta - juntamente com os meus CDs e livros preferidos - seriam sem dúvida uns quantos pacotes de “bolachas” Maria... (e uns litros de refrigerante para desembuchar, s.f.f.).
Lembro-me em pequeno quando comprava quinze tostões delas na mercearia da Sra. Natália, que m’as aviava profusamente num cartucho de papel pardo. Sabia melhor e satisfazia bem mais do que um rebuscado e módico bolo da pastelaria do Sr. Manel ali na outra esquina. Depois ainda tinha que as comer avaramente, à pressa, num recanto escuro das escadas do prédio, subjugado pela gula - para não ter que as repartir com os meus insaciáveis irmãos.
A Bolacha Maria é uma receita simples de enorme sucesso. Por mais que se inventem mais variedades, bolachas mais finas ou sofisticadas, a previsível Bolacha Maria nunca enjoa, cai sempre bem. Por exemplo, ao lanche sabem tão bem aos pares, com uma redundante porção manteiga de entremeio, acompanhadas com um chá quente ou uma laranjada fresca.
Num mundo pleno de imprevistos, novas experiências, radicais performances, jornalistas de causas, cozinha de fusão ou apenas nouvelle; cheio de modas e novos conceitos, experimentais ou definitivos, novíssimos softwares e hardwares, mais às suas actualizações, online ou offline... é muito reconfortante saber que existem algumas sensações previsíveis, experiências que não mudam, sabores resistentes e imutáveis.

Raios partam esta ingrata dieta... que exacerba o meu apetite, e que mal resiste a uma frugal escapadela... ali ao armário da cozinha.

Sto. António dos Olivais

É verdade que passei uma boa temporada em Coimbra, vivi em Sto. António dos Olivais. Lembro-me que ouvia Lloyd Cole de mais, e que um dia uma bem intencionada alma me ofereceu um gatito siamês para minha salutar companhia. Acho que o animal chegou demasiado crescido às minhas mãos, já elegante e lustroso. Desde então tentámos com afinco domesticarmo-nos mutuamente, mas a causa era perdida - foi curta e inglória a sua passagem na minha vida. O bichano, além de não me ligar peva, possuía uma estranha extravagância: subir às arvores que não sabia descer. Uma noite, de madrugada, acordei estremunhado com os seus miados aflitos. Espreitei ensonado para o quintal, e lá estava ele, empoleirado num tronco da alta árvore. Na noite seguinte ao chegar a casa, àquela pacata rua de província, o gato lá permanecia, balanceante, num ramo ainda mais alto e mais frágil, com um miar mais sonoro e desesperado. Pressenti os olhares estremunhados e recriminatórios dos meus vizinhos, ocultos pelas suas térreas gelosias. Ao terceiro dia, finalmente entrou em casa despenteado, rouco e a coxear. Dei-lhe uma reconfortante refeição, e nessa noite ambos dormimos um sono profundo e retemperador.
Que eu me lembre, a cena repetiu-se mais duas vezes. À medida que o tempo passava, o bicho subia mais alto, para os mais frágeis e trémulos ramos, ao nível de um segundo andar. O pânico da vertigem impelia-o para o alto. Atirei-lhe com pinhas, chamei os bombeiros, a situação era desesperada. Até que o gato caía de maduro, pelo cansaço ou pela força do vento.
O bicho era bonito. Olhos verdes claros, por detrás duma mascarilha castanha a condizer com as botas e luvinhas, sobre um pelo sedoso bege claro. Uns dias mais tarde o bichano desapareceu. Foi algum incauto forasteiro que o roubou, atraído pela fidalga figura do estúpido animal. Ou então um vizinho mais zeloso lhe deu um curativo fatal. Para bem da boa vizinhança.
Demorou algum tempo mais para que eu próprio, pelo meu pé, descesse da minha árvore.

Caro João Villalobos:

Foi com muito gosto e com emoção que comparecemos na festa de anteontem, na Casa Fernando Pessoa, ali a Campo d’ Ourique, pró lançamento do teu pequeno livro de poemas. Não sei se reparaste que durante aquela noite morna não tocavas com os sapatos no chão: planavas. É com certeza salutar um banho de amigos assim. A casa estava cheia, e eu até tive de ouvir a apresentação lá do alto das escadas, por detrás de uns quantos ombros anónimos. Pareceu-me aliás que por lá formigavam uns quantos... talvez não como os das nossas caixas de comentários, mas daqueles que se encontram na bicha do trânsito ou nas vernissages. De resto, pelo que me foi dado observar, todos compraram o teu livro, que é uma coisa própria para os bons anónimos fazerem - fica já aqui o repto.
Depois tiveste ali, incondicional e veneradora, toda a trupe corta-fiteira, à parte do Francisco que anda lá por fora a lutar p’la vida. E olha que notava-se bem como as donzelas do nosso blogue não andam de autocarro... Enfim, todos boa gente, não te deixamos ficar mal, deves ter reparado: integramo-nos bem, não partimos muita loiça, não dissemos mal do Sócrates assim muito alto. Enfim até demos algum ambiente à coisa; o Francisco José Viegas, bom anfitrião, deve ter ficado aliviado.
Mas olha João, que foi ainda na sexta-feira à noite que me deliciei com alguns dos teus poemas. Uns eram apenas umas curtas frases encantadas, de amor ou não; nalguns notava-se-lhes até umas nesgas de carne viva; coisa boa, vinda dum poeta.
Um abraço, parabéns e até sempre!

O final de Domingo

Tão justificada como me pareceu há quase um ano a minha partilha dominical de tocantes leituras do Novo Testamento aqui no Corta-fitas, considero hoje pertinente terminar esta minha iniciativa que vos garanto ter sido bem intencionada. Faço-o em plena liberdade, e por ter dúvidas sobre a legitimidade e eficácia da mensagem tornada “sistemática” neste ambiente tão heterogéneo, para mais sem um enquadramento teológico. Naturalmente jamais prescindirei de reflectir a minha fé e as minhas convicções pessoais que são indissociáveis dos meus escritos. Pela condescendência de todos, os meus sinceros agradecimentos.

Sábado amargo

Não conheço as circunstâncias protocolares em que o Rei Juan Carlos terá mandado calar o seu homólogo venezuelano na cimeira ibero-americana em Santiago do Chile. No entanto está comprovado o cariz irresponsável e déspota de Hugo Chavez, e comprovada está a superior legitimidade dum regime democrático como o da nossa vizinha Espanha.
O mundo livre teme pelo futuro do povo venezuelano. Nós vivemos resignados à fatal e submissa realpolitik da nossa virtuosa república, em prol da qual impunemente se subjugam os mais sagrados valores civilizacionais, quantas vezes por um mero prato de lentilhas.
Mesmo assim não nos devíamos todos envergonhar com as atabalhoadas declarações de apoio a Hugo Chaves proferidas à imprensa pelo nosso primeiro ministro na sequência do incidente, numa desprezível disposição subalterna?
Para além de medíocres, teremos que actuar como cobardes?

Imagem do Sol

Here Comes The Flood