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João Távora

Repressão total

Numa viragem de tendência, em 2007 as mortes na estrada em Portugal prevêem-se de novo em crescimento. Nos primeiros onze meses do ano, mais de oitocentos portugueses perderam a vida em acidentes de viação. Um número assustador se da abstracção dos números “descermos” um pouco à terra, aos implícitos dramas reais.
Na semana passada, quando com a família me deslocava a Alcácer na estrada nacional, aconteceu-me por duas vezes ter sido “empurrado” para a berma pelos habituais fangios de fim-de-semana quando ultrapassavam o seu “comboio” de trânsito numa imaginária segunda faixa. Os sustos foram grandes e confesso que, apesar da minha longa experiência de condução, não me parecia possível que a arrogância e a inconsciência pudessem chegar a tanto. Pensei para com os meus botões que estes artistas da estrada eram indígenas que, conhecendo aquela estrada, davam como adquirida a qualidade do piso das suas bermas, para onde literalmente atiravam os carros que apanhavam em sentido contrário. Provavelmente engano-me e são apenas homicidas encartados, que é o que acontece com grande parte dos portugueses quando conduzem. No fundo, o bom do Tuga, boçal e sem qualquer noção de civismo, costumeiramente testa a sua frustrada virilidade ao volante. Pagamos o preço duma cultura de brandos costumes, tradicionalmente paternalista e desresponsabilizadora: nas estradas deste Jardim à Beira Mar Plantado impera impunemente a selvajaria e arbitrariedade, um salve-se quem puder, para o qual as autoridades teimam em fechar os olhos.
Tenho uma amiga minha que conduz SEMPRE à velocidade legal, e por seguir escrupulosamente as regras torna-se quase perigosa, no meio do caos improvisado nas estradas nacionais. Chamam-lhe louca, mas de facto os loucos são os outros que a seu bel-prazer reinventam as regras consoante a conveniência.
Contra o tradicional relativismo legal, a indolente tolerância latina, hoje não tenho dúvidas em advogar uma radical revolução cultural: a intolerância total, a repressão pesada aos prevaricadores. Defendo uma acção de âmbito nacional, com dolorosas multas e penas e sem prazo final. Assim, salvavam-se algumas vidas humanas, e - à atenção dos Srs. Políticos - era bom para o deficit das contas públicas além de melhorar as estatísticas.
E, enquanto não chegasse a civilização ao ensino e às famílias portuguesas, com estas medidas ganhávamos todos, ou pelo menos ganhávamos aqueles para quem o automóvel é só um meio de transporte e para quem a morte e o sofrimento requerem se possível um sentido maior.