A cena registada no Carolina Michaelis é chocante e as imagens roçam a pornografia. Preocupante é quão banal se tornou hoje a pornografia. E ao contrário do que afirma
aqui o João Gonçalves, parece-me que as origens desta cena, que é apenas a ponta do iceberg, já vêm de muito longe, pelo menos desde o advento das "amplas liberdades".
Lembro-me bem quando ainda no final dos anos setenta, no Liceu Pedro Nunes, um dos mais populares divertimentos era estilhaçar vidros da Escola Machado de Castro, cujo edifício se debruçava na encosta do nosso pátio. Recordo-me como certa vez, naqueles anos loucos de embriaguês libertária, entre o primeiro e o segundo toque, a turma cúmplice atirou as carteiras todas pela janela abaixo para se esquivar à maçada de uma aula de duas horas de matemática. “Proibido proibir” era a máxima mais popular. Entre uma greve, um jogo de snooker no Jardim Cinema e uma RGA, a rapaziada divertia-se. Claro que havia Professores, com os quais ninguém “fazia farinha” e que naturalmente exerciam a sua autoridade e ensinavam. Outros sobreviviam à beira de um ataque de nervos, como era o caso daquela giraça stôra de português que veio a cumprir uma bem sucedida carreira politica num partido do arco do poder. Sobravam ainda aqueles professores modernaços ou trotskistas que pareciam divertir-se com toda aquela cegada: não davam negativas nem marcavam faltas. Desconfio até que só não partilhavam um charrito com o pessoal por mero acanhamento. Não sei se algum, alguma vez, chegou a ministro da educação.
Eu, que cresci nesses tempos, como um filho pródigo atravessei o deserto, paguei as favas e sobrevivi. Devo isso provavelmente à religião e a alguns tabefes parentais que afinal não foram totalmente desaproveitados.
À parte os trotskistas, que se extinguiram no ensino e noutros ofícios, dá-me a impressão que até hoje as coisas permanecem relativamente na mesma. Consumada a adolescentocracia, a delinquência na escola despiu as máscaras ideológicas e legitimou-se. A norma é considerada castradora, basicamente perversa para a "escola de vida" onde o mérito é o ultimo dos critérios. O ensino, questão acessória, tem que ser divertido, tolerante, participativo e relativo como afinal é tudo na vida moderna, a começar pelo "bem" e pelo "mal". Daí a pregar uma pêra ao stôr é só um pequeno passo, ou não somos todos iguais e cheios de direitos?
Resta saber o que os pais da minha geração estão dispostos a sacrificar e a prescindir para agradar aos seus anafados principezinhos. Uma duvidosa licenciatura numa privada, muitos direitos e a chave de um automóvel, tudo sem contrariedades nem esforço. Deixem então as vossas criancinhas fazer o que bem lhes aprouver, pois entre mortos e vivos alguém há-de escapar neste país de medíocres. E acreditem que os professores humilhados são o menos maligno dos danos colaterais.