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João Távora

Dois anos de prosas

Completam-se hoje dois anos que me estreei na blogosfera, aqui no Corta-fitas. Mal eu sabia então no que me estava a meter, e ao contrário do que muitos blogers gostam de proclamar aos sete ventos, a minha vida desde então mudou substancialmente: além da realização pessoal que descobri por via desta intervenção escrita, tive a sorte de conhecer gente divertida e de até descobrir algumas boas amizades. A todos os que têm tido a benevolência de comigo partilhar esta bela aventura, aqui deixo a expressão da minha gratidão.

As farpas da Madeira


Para Alberto João Jardim vai chegar a hora, provavelmente pela altura da sua merecida reforma, em que os seus adversários mais credíveis, mesmo que parcimoniosamente, se juntarão ao coro rendendo homenagem ao corajoso dirigente pela sua ímpar carreira ao serviço dos madeirenses e da sua ilha da Madeira. A constante diabolização do líder regional por parte dos seus fracos rivais e eternos falhados soa a mau perder, quando não a mau carácter político. É por isso que não estranho o reconhecimento dos seus méritos por parte de um dos poucos socialistas no activo com sentido de história e de estado – Jaime Gama.

De resto, supondo que afinal de contas o poder da Madeira nos últimos 30 anos foi alcançado de forma ilícita e sistematicamente reconhecido por incompetência das instituições, seria todo o sistema, incluindo os seus órgãos de poder, que estariam desautorizados. E nesse caso a nossa classe dirigente deveria no mínimo ser declarada inepta e compulsivamente interditada e aposentada.     

Domingo

Evangelho Cristo segundo São João - 20, 19-31

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Na tarde daquele dia, o primeiro da semana, estando fechadas as portas da casa onde os discípulos se encontravam, com medo dos judeus, veio Jesus, apresentou-Se no meio deles e disse-lhes: «A paz esteja convosco». Dito isto, mostrou-lhes as mãos e o lado.

Os discípulos ficaram cheios de alegria ao verem o Senhor. Jesus disse-lhes de novo: «A paz esteja convosco. Assim como o Pai Me enviou, também Eu vos envio a vós». Dito isto, soprou sobre eles e disse-lhes: «Recebei o Espírito Santo: àqueles a quem perdoardes os pecados ser-lhes-ão perdoados; e àqueles a quem os retiverdes ser-lhes-ão retidos». Tomé, um dos Doze, chamado Dídimo, não estava com eles quando veio Jesus. Disseram-lhe os outros discípulos: «Vimos o Senhor». Mas ele respondeu-lhes: «Se não vir nas suas mãos o sinal dos cravos, se não meter o dedo no lugar dos cravos e a mão no seu lado, não acreditarei».

Oito dias depois, estavam os discípulos outra vez em casa e Tomé com eles. Veio Jesus, estando as portas fechadas, apresentou-Se no meio deles e disse: «A paz esteja convosco». Depois disse a Tomé: «Põe aqui o teu dedo e vê as minhas mãos; aproxima a tua mão e mete-a no meu lado; e não sejas incrédulo, mas crente». Tomé respondeu-Lhe: «Meu Senhor e meu Deus!». Disse-lhe Jesus: «Porque Me viste acreditaste: felizes os que acreditam sem terem visto».

Muitos outros milagres fez Jesus na presença dos seus discípulos, que não estão escritos neste livro. Estes, porém, foram escritos para acreditardes que Jesus é o Messias, o Filho de Deus, e para que, acreditando, tenhais a vida em seu nome.


Da Bíblia Sagrada

Parque infantil


Há algum tempo que não ia a um parque infantil, e confesso que o ambiente contém algo que me fascina: aquela atmosfera colorida e agitada, com pequenos anõezinhos guinchando à volta dos baloiços e das árvores, correndo pela relva, aos molhos e aos saltos. As mães, os pais e avós, aperaltados, todos soam estranhamente maternais, numa cumplicidade vigilante e assexuada. E o modo como o pai joga à bola com o petiz, num jeitinho amestrado, quase ridículo. As conversas são tontas como as lengalengas infantis e a música de carrossel. No parque infantil quase somos inocentes outra vez, e de nada nos serve levarmos o livro que queríamos acabar.

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Na imagem: Parque do Alvito, Lisboa: daqui

Não é um avião, não é um pássaro, é uma jornalista em órbita!

De certo modo admiro a retórica e o moralismo de conveniência da jornalista Fernanda Câncio. No seu apontamento de hoje no Diário de Notícias descobre-se que afinal toda uma  nação ensandeceu à sua volta e que o facto a ter em conta no caso da “professora brutalizada pela aluna no Carolina Michaëlis ” é a abusiva utilização de imagens “privadas” do youtube pelas televisões. De resto, não interessa nada questionar a sustentabilidade de uma escola pública em que a instrução se tornou numa questão secundária. Que importância tem afinal o ancestral sonho de universalizar o ensino como nobre instrumento civilizacional? Suspeito que ao reafirmar a minha indignação com o caso Carolina Michäelis, resta-me a  consolação de ter contribuído para colocar a dita jornalista "em órbita". Bom era que ficasse por lá...

Nostalgia, cada um tem a que merece...




Revejo-me na comoção da visita presidencial a Moçambique. A minha mulher, como a grande maioria das portuguesas, também se chama Maria, e casualmente acompanha-me em incursões saudosistas na Lisboa em que cresci. Do Estoril onde vivo hoje ao cenário dos meus tempos de menino é apenas um pequeno salto.  Pelo Bairro Alto ou na Avenida da Liberdade, por Picoas ou em Santos o Velho, de Santa Marta à rua da Palma, os cheiros e as imagens ainda nos reavivam memórias e sensações passadas. Mas cedo ficamos chocados com a deprimente destruição que grassa por meia cidade: entremeado com sofisticados centros comerciais e prédios de escritórios, deparamos com o entulho borrado de graffiti,  janelas e portas entaipadas, quarteirões em escombros e paredes periclitantes. Um quadro dantesco de uma cidade arruinada, devoluta e inviável.

Sobre a boa educação

Um dos grandes equívocos da “cultura” urbana vigente é a pressuposta benignidade pedagógica da outorgação do livre arbítrio quase incondicional ao jovem adolescente, que por natureza é rebelde e transgressor.

Parece-me a mim que um adolescente responsável e ponderado é uma aberração. Lá em casa, a liberdade que vamos concedendo aos miúdos é controlada à distância e à condição do mérito patenteado nas tarefas e projectos em que estão envolvidos. Por outras palavras: às vezes a regra é mesmo a repressão, exercida com muito “afecto” e “envolvimento”... se eles estiverem para aí virados. Enfim; é uma canseira, para mais sem garantias nos resultados.

Não sejamos ingénuos: se na escola ou noutros espaços públicos os seus limites não forem claros e firmemente impostos, eu não ponho as mãos no fogo pelas suas atitudes e escolhas. E se por acaso o estimado leitor ainda não tem filhos na idade do armário e não percebe do que eu estou a falar, visite uma escola pública ou veja umas horas de  MTV numa tarde destas. E depois não se ponham a afogar os petizes no lavatório, pois vão-se arrepender e além disso a maioria deles voltarão a ser razoáveis lá para os vinte e tais. É quase certo.

Domingo - de Páscoa



Evangelho segundo S. João  20, 1-9

No primeiro dia da semana, Maria Madalena foi de manhãzinha, ainda escuro, ao sepulcro e viu a pedra retirada do sepulcro. Correu então e foi ter com Simão Pedro e com o outro discípulo que Jesus amava e disse-lhes: «Levaram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde O puseram». Pedro partiu com o outro discípulo e foram ambos ao sepulcro. Corriam os dois juntos, mas o outro discípulo antecipou-se, correndo mais depressa do que Pedro, e chegou primeiro ao sepulcro¬. Debruçando-se, viu as ligaduras no chão, mas não entrou. Entretanto, chegou também Simão Pedro, que o seguira. Entrou no sepulcro e viu as ligaduras no chão e o sudário que tinha estado sobre a cabeça de Jesus, não com as ligaduras, mas enrolado à parte. Entrou também o outro discípulo que chegara primeiro ao sepulcro: viu e acreditou. Na verdade, ainda não tinham entendido a Escritura, segundo a qual Jesus devia ressuscitar dos mortos.
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Da Bíblia Sagrada

Os sagrados direitos e as amplas liberdades

A cena registada no Carolina Michaelis é chocante e as imagens roçam a pornografia. Preocupante é quão banal se tornou hoje a pornografia. E ao contrário do que afirma aqui o João Gonçalves, parece-me que as origens desta cena, que é apenas a ponta do iceberg, já vêm de muito longe, pelo menos desde o advento das "amplas liberdades".

Lembro-me bem quando ainda no final dos anos setenta, no Liceu Pedro Nunes, um dos mais populares divertimentos era estilhaçar vidros da Escola Machado de Castro, cujo edifício se debruçava na encosta do nosso pátio. Recordo-me como certa vez, naqueles anos loucos de embriaguês libertária, entre o primeiro e o segundo toque, a turma cúmplice atirou as carteiras todas pela janela abaixo para se esquivar à maçada de uma aula de duas horas de matemática. “Proibido proibir” era a máxima mais popular. Entre uma greve, um jogo de snooker no Jardim Cinema e uma RGA, a rapaziada divertia-se. Claro que havia Professores, com os quais ninguém “fazia farinha” e que naturalmente exerciam a sua autoridade e ensinavam. Outros sobreviviam à beira de um ataque de nervos, como era o caso daquela giraça stôra de português que veio a cumprir uma bem sucedida carreira politica num partido do arco do poder. Sobravam ainda aqueles professores modernaços ou trotskistas que pareciam divertir-se com toda aquela cegada: não davam negativas nem marcavam faltas. Desconfio até que só não partilhavam um charrito com o pessoal por mero acanhamento. Não sei se algum, alguma vez, chegou a ministro da educação.

Eu, que cresci nesses tempos, como um filho pródigo atravessei o deserto, paguei as favas e sobrevivi. Devo isso provavelmente à religião e a alguns tabefes parentais que afinal não foram totalmente desaproveitados.

À parte os trotskistas, que se extinguiram no ensino e noutros ofícios, dá-me a impressão que até hoje as coisas permanecem relativamente na mesma. Consumada a adolescentocracia, a delinquência na escola despiu as máscaras ideológicas e legitimou-se. A norma é considerada castradora, basicamente perversa para a "escola de vida" onde o mérito é o ultimo dos critérios. O ensino, questão acessória, tem que ser divertido, tolerante, participativo e relativo como afinal é tudo na vida moderna, a começar pelo "bem" e pelo "mal". Daí a pregar uma pêra ao stôr é só um pequeno passo, ou não somos todos iguais e cheios de direitos?

Resta saber o que os pais da minha geração estão dispostos a sacrificar e a prescindir para agradar aos seus anafados principezinhos. Uma duvidosa licenciatura numa privada, muitos direitos e a chave de um automóvel, tudo sem contrariedades nem esforço. Deixem então as vossas criancinhas fazer o que bem lhes aprouver, pois entre mortos e vivos alguém há-de escapar neste país de medíocres. E acreditem que os professores humilhados são o menos maligno dos danos colaterais.

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