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João Távora

O valor da palavra

Estranham-se as virgens ofendidas que vêm a terreiro esconjurar a inconfidência de Bagão Félix ao contrariar uma declaração de José Sócrates na televisão. Aqui chegados quem é que ainda duvida sobre quem fala com independência e verdade? Que valor é dado por estes dias à Palavra dada?
Também me custa entender a súbita sacralidade pretendida por algumas tias viúvas do regime para o Conselho de Estado, órgão e consultivo e de nomeação de um Chefe de Estado com poderes pouco mais do que simbólicos. 
Se o País e a credibilidade das suas instituições chegou ao que chegou, certamente não foi devido a algum excesso de zelo dos poderes e seus agentes com o altruísmo e com a Verdade. O desastre resulta do crescente triunfo da Imagem em detrimento da substância, numa cultura do relativismo moral, fenómeno que indubitavelmente se difundiu de cima para baixo. Um modelo de sociedade estéril e de economia inviável. Portugal não está só falido nas finanças, está falido nos valores.

A favor de Portugal

Quem ouvisse na sexta-feira pela 1ª vez o programa “Contraditório” da Antena 1, um debate entre Ana Sá Lopes, Carlos Magno e Luís Delgado, três afamados jornalistas da nossa praça, atendendo ao nome do programa certamente estranharia tanta unanimidade. Os três  manifestavam-se contra  Cavaco Silva e Passos Coelho, rejeitando a solução FMI antes das eleições, como senas actuais circunstâncias  tal fosse uma questão de  vontade. Eu, que sigo com alguma frequência este programa da rádio Estatal paga com o dinheiro dos meus impostos, habituei-me a esta harmonia “corporativa” e consensual complacência para com a governação de José Sócrates, ora visto como vítima de “campanhas negras” ora de perversas traições e factores exógenos que conduziram o País ao actual estado de pré-falência. Ironicamente tem sido o cordato Luís Delgado,  o ex-fiel paladino de Santana Lopes e actual consultor da PT o mais reverente defensor da governação socialista. Convicções, são convicções. 

Aceito desportivamente o endémico e desequilibrado tendenciosismo jornalístico, um fatídico reflexo da sociologia lusa: é o preço a pagar pela fraqueza das elites, pelos séculos de fome e paternalismo provinciano. Mas tendo em conta a extrema gravidade da situação que se vive e dos valores postos em jogo, parece-me hoje premente e indispensável um sonoro apelo ao equilíbrio e moderação por parte dos jornalistas comentadores, que, sem que para tal tenham sido mandatados democraticamente, exercem desmesurada influência na opinião pública e consequentemente nos desígnios do eleitorado, como tal sendo co-responsáveis pelo estado de coisas. Ora justamente na Grécia onde se vivem por estes dias amargos um tremendo aperto económico e ajustamento de expectativas, o ódio popular é repartido democraticamente pelos políticos e... pelos jornalistas. 

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