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João Távora

Os direitos da Mulher

"O génio da liberdade alimenta-se mais dos nossos costumes que do vigor das nossas leis"

(José Joaquim Lopes Praça 1844 - 1920).

 

 

A propósito de um trabalho sobre a história do feminismo que tenho de momento em mãos, aqui vos deixo um pedaço da nossa história menos conhecida, talvez porque não serve os propósitos de propaganda que como se sabe tem de corresponder a uma narrativa estereotipada e linear.  

A história das causas feministas em Portugal só por falta de “massa critica” não recua para muito antes do Portugal constitucional, e a parte mais conhecida cinge-se aos escritos e intervenções das (desiludidas) militantes republicanas do inicio de Século XX, Carolina Beatriz Angelo, Ana de Castro Osório e Maria Veleda. Mas acontece que pedido de concessão do direito de voto às mulhe­res foi oficialmente feito pela primeira vez em Portugal, no dia 22 de abril de 1822 por Domingos Borges de Barros (na imagem), na sessão das Cortes Gerais, Extraordinárias e Constituintes da Nação Portuguesa, quando o deputado representante da Baía, propôs que as mães de seis filhos legítimos (!) pudessem votar nas eleições.

Aqui partilho um pequeno excerto do discurso do tribuno mais tarde “nacionalizado” brasileiro: “Ninguém tem mais in­teresses e apego a um país do que aquele que possui nele mais caros objectos, e ninguém mais atendido deve ser de uma Nação do que aquele que mais lhe presta: a mãe que tem seus filhos em um país, é sem dúvida, quem mais interesse, e apego por ele tem; e ninguém dá mais a uma Nação do que quem lhe dá os cidadãos: sendo como são estes princípios de suma verdade, temos que à mãe de família se não deve negar o direito de votar naqueles que devem representar a Nação. Não têm as mulheres defeito algum que as prive daquele direito, e apesar do criminoso desleixo que muito de propósito tem havido em educá-las, por isso que o homem mui cioso de mandar, e temendo a superioridade das mulheres as tem conservado na ignorância, todavia não há talentos, ou virtudes em que elas não tenham rivalizado, e muitas vezes excedido aos homens;” (…) “A Nação portuguesa que tanto se tem distinguido, eu quisera que em si fizes­se sobressair o amor filial, e que nós não negássemos a nossas mães, o que concedemos aos nossos assalariados; nem levados de prejuízos, o duvidemos fazer pela novida­de que a preposição parece encerrar. No estado de New Jersey, nos sete primeiros anos da sua independência, as mulheres votaram nas eleições, e confessam os America­nos que votaram sempre muito bem, confessam que torna ainda mais pecaminosa a cabala, e o partido que fez alterar, sem razão mais que o repreensível ciúme e amor de mandar nos homens, aquele tão louvável arbítrio que tinham tomado homens justos, e conhecedores do cora­ção humano. Por todas estas razões concluo, que quando a todas as mulheres que tiverem os requisitos que a lei exigir não for concedido votar nas eleições, ao menos te­nham esse direito as mães de seis filhos legítimos.”

 

In A Concessão do Voto às Portuguesas - Breve Apontamento de Maria Reynolds de Souza, Colecção Fio de Ariana – CIG, Comissão para a Igualdade de Género 2006

Joaquim Pais Jorge

Ainda não vi provado que "Joaquim Pais Jorge tenha tentado vender «swaps tóxicos» (o que quer que isso seja) para deturpar contas" do governo Sócrates. Mas espero que a autoria da patranha da falsificação do documento implicando o secretário de Estado numa reunião entre o Citygoup e o gabinete do 1º ministro em 2005 desperte uma proporcional curiosidade dos media.
De resto, faça-se então como disse hoje o senador António Capucho à Comunicação Social (com a qual colabora a fazer intriga política, provavelmente para angariar "gostos" no Facebook,) substitua-se Joaquim Pais Jorge por "alguém com capacidade e categoria, e sem ligações esquisitas, como um professor universitário"... ou talvez assim um querubim, digo eu.

Eu, não gosto de assassinatos de carácter. Nem por jornalistas nem por senadores.

Da privacidade nas redes sociais


A verdadeira estrutura da Internet – é sobre pessoas a conversar.”
Jeff Jarvis

 

Confesso que me fascina o tema da privacidade no contexto ao advento das redes sociais que vivemos por estes dias. No que ao assunto refere, numa sociedade securitária como a ocidental, cujos refinados mecanismos de controlo social atingiram o auge há algum tempo, são de ter em conta sensibilidades diferentes, acentuadas mais por questões filosóficas do que outras mal sustentadas.
Democratizado o acesso às múltiplas plataformas de auto-edição online, dos blogues à popular rede social Facebook, passando pela edição, arquivo e partilha de fotografia (Flikr ou Instagram) ou audiovisual (Youtube ou Vimeo), concedo que o mesmo não aconteceu com o bom senso do qual como se sabe cada um tem a sua noção e medida. Um problema de facto: para muitos utilizadores, o desafio acaba por estar em saber o que não se deve publicar (no sentido de por em comum) cuja norma depende do bom gosto de cada qual - que é coisa que aliás não se discute. Aqui chegados, é inegável que a revolução tecnológica a que hoje assistimos entregou ao cidadão comum ferramentas de comunicação com o potencial de competir ombro a ombro com qualquer produtora de televisão clássica. Assim como hoje em dia, um blogger qualquer, com arte e engenho pode facilmente constituir uma plateia de leitores mais numeroso do que aqueles que o seguiriam num jornal de referência.
Os milhões de gigabytes de conteúdos, em texto som ou imagem, que a cada hora são publicados por gente comum na rede mundial de informação digital, a simples geolocalização automática que as engenhocas portáteis proporcionam, transformaram o conceito de comunicação e definitivamente a própria Internet. Isso assusta muita gente que dificilmente entende a lógica deste enorme turbilhão de informação e criatividade humana em que vivemos… donde os melhores inevitavelmente sobressairão, livres de intermediações duvidosas. O desconhecimento promove mitos... e o medo é mau conselheiro. Citando o jornalista Jeff Jarvis em entrevista ao jornal Público em novembro do ano passado, "Até 1890 não havia discussão a sério sobre as questões legais de privacidade nos Estados Unidos e aconteceu por causa da invenção da câmara Kodak – as pessoas tinham medo que se pudesse tirar uma fotografia e aparecerem."
Tenho a impressão que hoje acabamos todos por ceder um pouco na privacidade para usufruirmos de mais liberdade. Sou dos que assina de nome completo as opiniões na net, e assume uma exposição bastante transparente nas redes sociais, onde não me coíbo de partilhar muita informação pessoal e profissional. E confesso que pouco me importo que o Google ou o eBay  “conheçam” os meus gostos ou o meu histórico de consumo.
Como refere Jeff Jarvis “Viver em público não mostra apenas que temos pouco a esconder; mostra que temos pouco a temer”, ademais, “quanto mais pública uma sociedade for, mais segura será.”
De resto um ribeiro continuará algures a correr indiferente, com a água borbulhando enremoinhada entre as pedras duma colina. O silêncio encontra-se sempre à distância de um interruptor, a serenidade dentro das paredes da catedral e um bom livro espera por nós na prateleira tal como a guitarra pendurada na parede.
Finalmente voltemos à questão da privacidade "perdida": não sei o que há quarenta anos passaria pela cabeça dos nossos avós, quando permitiam o seu nome e morada completa publicados em letra de forma no livro de maior tiragem e mais consultado à época: a Lista Telefónica. Eu, não me atrevo a tanto. 

 

Publicado originalmente aqui

Assim como assim, prefiro o segundo

Com estilos diversos, o barbeiro e o taxista têm em comum o hábito de fazer conversa fiada. O taxista é muitas vezes desastrado e virulento, aproveita encontro fortuito para aliviar as tensões. De prosa redonda e calculada, o barbeiro, diz-se, é do clube do freguês... que deverá voltar daí a um mês.

Uma gaiola bem fora da caixa

Boa malha é o filme "A Gaiola Dourada" de Ruben Alves, história centrada num casal de emigrantes portugueses em Paris, a porteira Maria (Rita Blanco) e o pedreiro José (Joaquim de Almeida); uma descomplexada comédia que luminosamente desmonta e parodia os clichés duma tão generosa quanto incompreendida (por mera inveja ou snobeira) diáspora portuguesa em França. 
Sem quaisquer pretensões a dissertação cientifica sobre o tema, o filme não cede à tentação dos estereótipos políticos do ressabiamento e da luta de classes a que o assunto tão bem se presta. É deste modo que o filme colhe o desprezo da crítica regimental, na exacta proporção em que se revela um sucesso de bilheteira.Também porque nos mostra despudorada ternura às coisas da Pátria, com caracteres generosamente pincelados em tons alegres (mesmo que artificialmente queimados por efeito de um qualquer filtro de lentes “vintage”), perspectiva talvez mais acessível a quem sendo um de nós, nos vê de longe como a uma paradisíaca paisagem do Douro. Apesar da história e apesar da crise, pois então.

Independentemente de diferentes enquadramentos ou análises, os clichés são sempre irrefutáveis pedaços de verdade. E só nos deveria fazer rir a confusão dos “patrões” franceses de José entre Oliveira Salazar e o general Alcazar, personagem das aventuras de Tintim. Assim como a eterna confusão que a generalidade dos estrangeiros sempre fará entre o vocabulário castelhano e português.
Mas acontece que em duzentos anos largámos a religião para nos entornarmos em prantos aos pés dos psiquiatras e dos sociólogos. Ao contrário do crítico António Loja Neves da revista Actual do Expresso que deve perceber de cinema como pouca gente, eu espero daqui a dez anos Ruben Alves, filho de emigrantes, mantenha intacto o orgulho nesta sua bem-sucedida estreia dedicada aos seus pais, afinal de contas feita com alma e coração - quase sempre factor determinante para uma boa realização. Ao que se saiba, sustentável do ponto de vista económico, que é para além do mais uma lufada de ar fresco e oxigenado, com a qual as carpideiras profissionais não se dão bem nem se conformam. O nacional negativismo é pior do que uma gaiola, é uma sufocante caixa fechada, mas só lá vive quem quer.


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