Intervalo
I get the news I need on the weather report.
I can gather all the news I need on the weather report.
Hey, I've got nothing to do today but smile.
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Nesta silly season que ora se inicia, por conta da biografia de Ribeiro Meneses publicada em fascículos pelo Expresso, revisitamos Oliveira Salazar. No meu entender o ditador veste como uma luva as expectativas de uma época que em certa medida hoje persistem: o provincianismo messiânico. Isso justifica a longevidade do seu pontificado. Ontem como hoje são poucos os portugueses que fazem diferença e a mediocridade faz escola - os maus hábitos não acabam por decreto. Ontem como hoje temos aquilo que merecemos, órfãos a mistificar um pai utópico que nos devolva uma Pátria virtuosa escondida nas brumas da memória. Quero dizer: Salazar não instaurou uma mentalidade, mas ele foi fruto dela e soube servir-se dela para "levar os portugueses a viver habitualmente", aquilo que quase toda a gente queria. Resta-nos manter a inquietação.
Pela minha parte tenho como verdadeiros os atributos e competências atribuídas pela jornalista Maria Teixeira Alves a Ricardo Salgado que o Daniel insinua serem padrão da atitude de servilismo existente em relação aos poderosos. Até poderá ter alguma razão mas enganou-se no exemplo. Sei por vários testemunhos pessoais como o banqueiro é uma pessoa de trato fácil, que procura uma proximidade e um contacto directo com as pessoas sem pruridos hierárquicos que, com o dom de uma memória prodigiosa, a todos trata amigavelmente pelo nome próprio. Nada destes traços de carácter me parecem incompatíveis com erros ou crimes que Ricardo Salgado possa ter cometido no âmbito da gestão dos seus negócios e que se espera seja julgado com isenção. Daí que me pareçam abusivas as ilações do Daniel Oliveira, essas sim fruto de ressentimentos ideológicos (desprezo cultural, como o próprio lhe chama) em relação à jornalista do Diário Económico. O problema do Daniel é, além de se deixar subjugar pelos tais desprezos selectivos absorvidos da cartilha revolucionária de que não se consegue libertar, a veleidade de querer encaixar as pessoas no seu arquétipo pequenino e a preto e branco com que interpreta a realidade à sua volta. Ainda bem que verdadeiramente não é um jornalista. Para já é apenas um diletante sobrevalorizado, o que é muito pouco para nos preocupar.
Ontem numa crónica publicada no jornal Expresso a ilustrar uma investigação jornalística sobre a alegada política de exclusão de links no Google “a pedido” no âmbito da questão recentemente levantada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia do pretenso “direito ao esquecimento”, o seu autor, Miguel Cadete, além de outros equívocos levanta suspeitas sobre a transparência utilizada na indexação de conteúdos daquele motor de busca. Vale-nos como desconto a declaração de interesses que o jornalista evoca ao assumir má vontade com a Google, companhia a que imputa responsabilidades na crise que “há décadas perpassa pela imprensa”, com as conhecidas consequências no esforço de adaptação que vem exigindo ao sector.
Como apaixonado desta profissão que tenho como das mais nobres, conforta-me saber que os jornais perscrutam e vigiam toda a sorte de poderes e particularmente uma grande empresa como a Google. Sensível às angústias enunciadas pelo cronista, não posso concordar de todo com as suas crenças e julgamentos, certamente motivados pelo medo, um sentimento o mais das vezes inspirado pelo desconhecimento. Nesse sentido, convém esclarecer que o facto de o motor de busca Google “não ter praticamente concorrência”, como refere Miguel Cadete, se deve ao seu complexo algoritmo, exclusivamente indexado à necessidade e proveito do utilizador e não a qualquer tipo de manipulação obscura. Tal implica que, por exemplo, a sua independência face ao negócio da publicidade constitua um valor crucial e sagrado: os links patrocinados (AdWords), a tal publicidade que segundo o cronista significa “um dos maiores negócios do mundo” (!), aparecem graficamente distinguidos daqueles de indexação orgânica. Depois, agitar o papão duma hipotética utilização abusiva dos dados (interesses) que plataforma Gmail capta nos conteúdos das mensagens para exibição de publicidade “dedicada” (AdSense), parece-me uma falácia, já que a não intervenção humana, para lá de questões éticas, é a única garantia de rentabilização do sistema. Ou seja, o tratamento racional (humano) e sistemático da informação, utilizador a utilizador, requereria uma astronómica quantidade de meios. Não saberá por certo o autor da crónica que o navegador desenvolvido pela Google (Google Chrome) permite configurar o bloqueio de publicidade ou eliminar o registo do histórico de navegação, e que a georreferenciação do utilizador (um dado muito útil em determinadas pesquisas) é meramente opcional.
A maior ameaça ao jornalismo continua a ser o mau jornalismo (seja ele fruto de sectarismo, preconceito ou ignorância), e não deixam de se verificar diariamente lançamentos de novos e ambiciosos projectos de comunicação social que aproveitam as oportunidades concedidas pelas novas tecnologias. Os desafios que estes tempos da Internet colocam à imprensa e à comunicação social em geral, por mais ameaçadores que aparentem ser, têm que ser enfrentados com criatividade e pragmatismo. E quanto a uma regularização racional dos preços da publicidade online e offline, há certamente muito a mudar e reformar pelas partes interessadas, principalmente aquelas que se mantêm presas a arquétipos ultrapassados. Finalmente os motores de busca, como eficazes instrumentos de propagação de conteúdos digitais que são, deverão ser assumidos de uma vez por todas, não como uma ameaça aos jornais mas como uma oportunidade: o factor mais decisivo para uma relevante posição nas pesquisas é a qualidade do conteúdo e a interacção que o mesmo potencia com o leitor. Se eu fosse jornalista considerava tudo isto boas notícias.
A propósito das manifestações de júbilo da chefe do governo alemão na vitória da selecção do seu País no mundial de futebol do Brasil, tenho a dizer que de algum modo chocou-me o despudor de algumas manifestações de ódio irracional testemunhadas em comentários nas redes sociais - às vezes provenientes de pessoas supostamente bem formadas. As apreciações à aparência física ou modo de vestir e demais injúrias feitas a Angela Merkel definitivamente qualificam mais quem as emite: além de má criação, reflectem afeições bem obscuras e mesquinhas que no mínimo deveriam ser disfarçadas por pudor.
Persistir no erro de pensar que os alemães, que elegeram a sua sua chanceler democraticamente com 41,5% dos votos, são os responsáveis pelos males dos países como o nosso que mostram mais dificuldades em sair da crise do crédito fácil é demasiado básico, e assim sendo, uma fatalidade para nós portugueses. Recusar aceitar que o sucesso económico da Alemanha reunificada é essencialmente mérito dos alemães, que para tanto se sacrificaram durante anos, negar assentir que no actual modelo de organização europeu ainda compete a cada governante privilegiar os objectivos e interesses do seu País e pugnar pelo progresso e bem-estar do povo que os elegeram, é um erro trágico que denúncia acima de tudo os nossos logros. Finalmente, pretender reduzir a herdeiros do nazismo ou boçais comedores de salsichas aquela que é a Pátria de Mozart, Beethoven, Kafka, Goethe ou Thomas Mann, Kant, Hegel, Marx Schopenhauer, Nietzsche, Habermas ou Marlene Dietrich, não será uma caprichosa criancice?
Pela minha parte tenho a confessar que após da eliminação do Brasil apoiei a Alemanha, selecção que já vinha demonstrando desde o início do torneio ser a equipa mais bem preparada, revelando um invejável (!) poder atlético, apuro técnico e eficácia táctica. Notas duma excelência cuja dor de cotovelo não nos deveria fazer cegar, antes saber tomar como bom exemplo. No futebol e no resto.
Aquela mórbida idolatria promovida à volta de Cristiano Ronaldo no mês que precedeu o Mundial de Futebol, que ironicamente coincidiu a campanha publicitária da sua parceria com a D. Inércia do Banco Espirito Santo, definitivamente não era um bom prenúncio. Para mais, além de ser um excepcionalmente dotado atleta que não se poupa ao empenho nos seus objectivos, acontece que o melhor futebolista do mundo tem o ego de um adolescente, e aquela inebriante mistificação tinha tudo para se tornar numa parábola sobre o triste fado dos portugueses. Pensar ser possível que um jogador sozinho mude o carisma de uma equipa de futebol mediana para vencedora, é por si uma ingenuidade infantil característica dos latinos em geral e dos portugueses em particular. Repare-se como é um exercício bem mais difícil fulanizar a selecção alemã através de uma só individualidade, tendo em consideração a alta preparação física, abundante qualidade técnica e inteligência táctica que fazem dela uma equipa absolutamente excepcional. Repara-se na ironia, ou enganador desliquilibrio, que reflectem os media ao personificarem o duelo da final de amanhã nas figuras de Müller e… Messi.
Talvez não seja abusivo extrapolar esta característica messiânica para outros planos da mentalidade portuguesa, como a excessiva valorização das lideranças de empresas e instituições, que são comummente mimoseadas com ordenados absolutamente desproporcionais à mais-valia que podem significar. Ou do fulanismo que representa o exagero de expectativas que os actores e comentadores políticos nacionais depositam nas decisões e opiniões de um só homem - cujo juízo só por natureza é limitado e imperfeito - o presidente da república, a quem ironicamente, “apenas” lhe sobeja o poder de dissolução do parlamento, um órgão colegial legitimamente eleito que reúne em confronto uma elite de representantes das diferentes facções nacionais, órgão que pela sua natureza plural tende à permanente autofiscalização e autocrítica.
Seja qual for o resultado do Mundial que termina logo mais no Maracanã, podemos ter já a certeza de que os louros duma vitória jamais dependeriam de um Neymar, um Ronaldo, ou um Messi (qua amanhã vai estar devidamente vigiado), por mais que a natureza humana reclame por ídolos. Não tenho a mais pequena dúvida de como a influência de um só indivíduo, uno e irrepetível, pode sempre fazer muita diferença, para o bem e para o mal, numa comunidade e na História de um povo. Mas a esta certeza junto a de que, quando uma comunidade tem depositada sobre um só indivíduo excessivas expectativas, o mais das vezes isso significa a sua demissão do papel que cabe a si e cada um na transformação dessa realidade, e é o reflexo de uma profunda infantilidade civilizacional, que faz prever os mais desastrosos resultados.
Sei que corro o risco de resgatar da completa irrelevância a entrevista dada por Joana Amaral Dias (JAD) a Nuno Ramos de Almeida publicada ontem no jornal i, que nas entrelinhas da ambiguidade em que mergulha a psicóloga e activista de esquerda, autora do livro recentemente publicado “O cérebro da Política“, não deixa de inquietar qualquer espírito livre e democrata.
Uma pessoa lê e relê o artigo e não acredita: partindo da consideração enunciada no seu livro de que o “posicionamento esquerda direita está ligado a uma estruturação psicológica que se dá por volta dos 18 meses”, que “as pessoas de esquerda e de direita tem personalidade, cognição e ambições diferentes” a entrevistada conduz-nos à conclusão cientifica de que “aquilo que nós sabemos (!) de uma maneira geral (!!!), é que a grande diferença entre os eleitores de esquerda e de direita é que os primeiros têm mais a capacidade de transformar aquilo que é inerente à condição humana, o ódio, o medo e a angústia, em laços com os outros – o tal poder para mudar”. Se restassem dúvidas, fica assim comprovada a génese e os sintomas da perversão de que padecem as pessoas que como eu têm tendências conservadoras e de direita. Mas deixa-nos mais descansados o facto de a psicóloga nos garantir esse defeito de carácter não constituir uma fatalidade pois que “essa estruturação é sempre passível de ser alterada”. “Sou psicoterapeuta e esse é em grande medida o meu trabalho.” Daí que desconfiamos que a propaganda política tenderá a breve trecho transitar dos discursos, debates e cartazes, para os infantários ou gabinetes do psicólogo. Subsidiado pelo Estado, esse Grande Irmão, está-se mesmo a ver.
Agora falando sério: na entrevista, JAD acaba por não se atrever a tirar grandes consequências de tudo isto, evitando até de forma habilidosa as soluções finais para as teses que defende, não concretizando “o tal caminho radical” para uma “transformação absoluta da sociedade” condicionada pela “política capitalista” na sociedade que temos.
Refere às tantas a ex-bloquista: "é pensar como é que educamos ou socializamos as pessoas que chegam ao mundo para ter um resultado diferente. Se as educamos assim, não podemos esperar que o resultado seja diferente” e "o que digo é que os primeiros anos do desenvolvimento têm estado arredados das questões políticas”. Mas pergunto eu, não serão tais “condicionalismos” de “uma estruturação psicológica infantil” em que JAD pretende a intervenção "terapêutica", a génese do individuo único e irrepetível, e manipular tal matéria por causa duma utopia política uma completa barbaridade? Trazer a interferência política para a infância precoce não será uma intromissão no plano mais íntimo das liberdades individuais e um descarado assalto à instituição famíliar? Se como defende a entrevistada a “questão racional na política são amendoins”, não manda a prudência sermos muito cautelosos na forma como desejamos implementar as nossas crenças?
Agora temos finalmente uma pista para entender o percurso de Joana Amaral Dias que, dos anos noventa, no auge do projecto “O Independente” e da revista K de Miguel Esteves Cardoso quando chegou a ser militante monárquica inscrita, chega aos nossos dias a cortejar a extrema-esquerda totalitária. Tal itinerário terá certamente sido percorrido com o auxílio de gabinetes de psicoterapia e psicanálise, espera-se que sem recurso a muitos expedientes farmacológicos. Porque nesse âmbito da saúde mental e psicológica navegam-se ainda mares pouco conhecidos e a prudência aconselha a que não se brinque com coisas sérias, sob o risco de se criar monstros.
"A defesa da imperfeição intelectual humana
começa por desautorizar a procura de ideais utópicos,
sejam eles revolucionários ou reaccionários,
porque as quimeras assentam na arrogância própria de quem se considera omnipotente ou omnisciente,
ignorando «a sua própria cegueira»
e as contingências inevitáveis que
sempre se abatem sobre a conduta humana."
João Pereira Coutinho – “Conservadorismo” D. Quixote 2014 pp 153
Curioso como quase sempre recordamos os nossos mortos pelos seus traços principais, momentos luminosos, devidamente despoluídos das mesquinhezes, desgastantes rotinas e conflitos. É uma questão de sobrevivência pois que somos também feitos dessas memórias, e por isso resguardamos as boas, que dessa forma nos completam e animam no projecto de sermos gente pela vida fora. Só assim é possível prestarmos tributos, amar os nossos heróis, construir os nossos panteões. Chegamos à idade adulta quando não dispensamos os nossos mortos, assim idealizados e suportados nas suas grandezas, perdoadas e resolvidas as disputas e mal entendidos. Assim nos integramos numa comunhão de pensar, ás vezes até em diálogos íntimos como preces, sobre tudo e sobre nada, sábios conselheiros que eles são.
Assim pela vida fora os nossos mortos ajudam-nos a crescer. Precisamos de amar os nossos mortos, e a nossa memória encarregar-se-á de arrumar a casa toda. Distanciados pelo tempo entendemos as precariedades mundanas e os pecadilhos terrenos. Perdoando-os também aprendemos a nos perdoar, a entender o difícil caminho da santidade, esta eterna construção. Que é permanecer com os nossos, pelos nossos depois da nossa vez. No sentido da Luz.
Foto: O meu irmão e eu nas docas de Alcântara por volta de 1967