Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

João Távora

Causas Perdidas?

Não me perco em “causas perdidas”, simplesmente porque não concebo os resultados das minhas disputas como binário, de “Ou Tudo ou Nada”. Sem cedências à amargura, empenho-me a "empurrar" a realidade que me cricunda - família, cidade, país, - para o lado que acredito ser o melhor, enquanto tiver forças e lucidez.

Generation gap 3

Há uns anos, a Marginal era perigosa, e a chegada a Lisboa pressentia-se no Viaduto das Águas Livres quando os pneus reverberavam nos paralelepípedos. Pela manhã tínhamos pão quente num saco de pano.

Generation gap 2

Há uns anos, as fotografias eram gravadas dentro da máquina em rolos de celulóide e “reveladas” por um profissional que as imprimia em papel.  Nas ruas do bairro viam-se crianças a brincar.

Generation gap 1

Há uns anos, quando víamos os Led Zepplin ao vivo no cinema (com "Sorround"), os autocarros tinham cinzeiros nas costas das cadeiras, e para telefonar da rua tínhamos de ter moedas e usar uma cabine.

I can get no satisfaction

conferencia-confianca-nas-instituicoes-politicas-i

 A falta de "Confiança nas Instituições Políticas", em termos europeus por estes dias é superior nos países atingidos pela crise do euro, nomeadamente os do sul da Europa e também a França. A falta de "Confiança nas Instituições Políticas" em Portugal expressa-se claramente na fraca militância politica nos partidos. A "Confiança nas Instituições Políticas" manifesta-se estatisticamente por uma superior literacia, escolaridade, cultura e integração social. O crescimento das candidaturas independentes é um sintoma de falta de "Confiança nas Instituições Políticas”, assim como o surgimento de “movimentos sociais de protesto”. Para que se não tirem conclusões precipitadas, registe-se que países como a China ou o Uzbequistão apresentam os números mais positivos no que diz respeito à "Confiança nas Instituições Políticas". 

Vem estas afirmações soltas a propósito da apresentação ontem no IDL, no âmbito do Ciclo “À Volta dos Livros” do Ensaio "Confiança nas Instituições Políticas" publicado recentemente pela Fundação Francisco Manuel dos Santos pela sua autora, a Professora Ana Maria Belchior. Todos os gráficos e estatísticas comparativas exibidos tornam evidente que os índices de confiança nas instituições políticas constituem um precioso termómetro dos problemas do sistema democrático ao qual os seus protagonistas deviam prestar mais atenção. Com causas diversas, que vão do incumprimento das promessas eleitorais ou da percepção de corrupção, só para dar dois exemplos evidenciados por Ana Maria Belchior, é evidente que urge uma reforma do sistema politico em Portugal e nas Instituições Europeias.
Não tão evidente mas mais perversa, porque do foro orgânico da nossa construção social, é, na minha opinião, a perigosa conjugação destes factores: o da natureza da democracia que se alimenta da "comercialização" de bem-estar em troca do voto, do cumprimento das expectativas cada vez mais sofisticadas dos indivíduos, cuja natureza é para a permanente insatisfação, e cuja felicidade definitivamente não depende dos bens e direitos que conquistam, conjugado com um modelo de sociedade hipermediatizada, cujos agentes, a comunicação social, laboram numa lógica comercial dependente da exploração desse descontentamento e desconfiança. Não estou nada certo de que as sociedades mais descontentes com as instituições políticas sejam as que vivem objectivamente pior. O perigo da implantação da “referendocracia”, ou duma democracia “Fórum TSF”, é atirarmos fora o bebé com a água do banho.

Nas margens das margens

Aleluia.jpg

 Apesar das suas opiniões quase sempre diversas das minhas, foram duas ordens de razão que me dispuseram na passada Quinta-feira ir ao Lançamento de “Aleluia” de Bruno Vieira do Amaral: primeiro porque ele sempre demonstrou um exemplar cavalheirismo na forma como as afirma. A segunda é porque o seu livro trata de Cristãos como eu, e as suas concepções postas assim, deixam de ser uma agressão para se tornarem num estímulo à inquietação - que é o sobrenome de um devoto seguidor de Jesus Cristo. Nesta perspectiva conciliatória até acabo por entender a reclamação repetida pelo Bruno no dia do lançamento, de como se está nas tintas para "as fragilidades doutrinárias" numa determinada congregação religiosa. Para quem se reclama ateu como ele, compreende-se que sejam pouco importante os detalhes e argumentos que sustentam aquilo que para si quanto muito não passará de uma “efabulação” benigna. Mais difícil será o desafio de um leitor crente sentir o seu universo existencial objecto dessa investigação… por exemplo ser concebido como um “consumidor” e a sua Igreja como um “produto”. Augh!!!

Tudo isso não retira a minha curiosidade por este original ensaio sobre o Cristianismo Evangélico e a sua sobrevivência em Portugal. Acontece que na Europa do século XXI ser um dos de Cristo é militar nas margens. Facto que nos desafia a deixarmo-nos tocar por todos aqueles que habitam as margens das margens. Curiosamente onde o Papa Francisco nos recomenda o olhar.

Um "amor puro"

AG 2015_38.jpg (...)

A todos os meus colegas de missão, relembro que este é um desafio de Amor puro e verdadeiro, daquele que faz nobres as acções dos homens: só é fértil se completamente desinteressado. Daqui não ganhamos reputação nem comendas. Mas quando trabalhamos e combatemos pelos nossos mais profundos ideais aquilo em que acreditamos realizamo-nos como Pessoas completas. 

(...)

Agora vem o tempo de darmos continuidade a toda esta história. E a "Continuidade", um termo tão caro aos monárquicos, trata-se na realidade de um enorme desafio, a administração realista das oportunidades e recursos existentes, trabalho duro de formiga aparentemente inglório porque rotineiro, mas que nos fortalece e prepara para cumprir o nosso destino: mantermos a chama acesa da Instituição Real que com Portugal nasceu e o incorpora há quase 900 anos. É essa a expectativa que pesa nos nossos ombros.

É em prol deste objectivo que agradeço o apoio e a colaboração de todos os associados.

Obrigado a todos os meus amigos que me acompanham neste projecto, e que Deus me ajude a cumprir com sucesso este exigente desafio.

 

Viva o Rei,
Viva Portugal.*

 

*Excerto do meu discurso de posse como

Presidente da direcção da Real Associação de Lisboa,

Lsiboa, 21 de Março de 2015

João Távora

 

O mistério da invisibilidade da música gravada em Portugal no início do Século XX

1 - Capa_Machinas_Falantes.jpg

 “Só o fonógrafo, Zé Fernandes, me faz verdadeiramente sentir a minha superioridade de ser pensante e me separa do bicho. Acredita, não há senão a Cidade, Zé Fernandes, não há senão a Cidade!”

                                                                 Eça de Queiroz, “A Cidade e as Serras”

 

Imagine que nas arrumações do sótão da casa dos seus avós encontrava um álbum de fotografias de família dos primeiros anos do século XX — a sensação que essa descoberta faria. Agora, imagine que no mesmo sótão encontrava um fonógrafo, ou um gramofone da mesma época, e uns quantos cilindros de Edison ou discos de goma-laca com a gravação das vozes ou cançonetas dos seus antepassados. É um facto geralmente ignorado que a audição de fonogramas e a indústria fonográfica em Portugal deram os primeiros passos na passagem do século XIX para o XX, ao mesmo tempo que a fotografia “caseira” com as máquinas compactas Kodak. De facto, há em Portugal várias décadas de História da música gravada, dos seus produtores e intérpretes, que são anteriores ao cinema sonoro e ao fenómeno Amália Rodrigues.

Machinas Fallantes: A música gravada em Portugal no início do Século XX, coordenado por Leonor Losa e publicado recentemente pela Tinta da China, desvenda-nos esse mundo desconhecido. Trata-se de um estudo etnomusicológico da música gravada em Portugal desde a primeira notícia publicada na revista O Occidente, em Abril de 1878, sobre os fundamentos técnicos do fonógrafo de Edison (um ano depois da sua invenção).

Este livro profusamente ilustrado, acompanhado por um CD com 20 fonogramas restaurados, oferece pela primeira vez para o grande público um inventário de gravações históricas, partituras, catálogos de discos, documentação de empresas discográficas, lojas, lojistas, empresários, artistas, iconografia, anúncios na imprensa, registos de propriedade industrial, etc. São 240 páginas com um grafismo elegante, que harmoniza com eficiência a profusão de imagens e notas com o texto, beneficiando o leitor da intenção da autora se libertar dos jargões próprios da academia (nem sempre bem-sucedida).

Se ainda ao tempo dos mais toscos cilindros de Edison, as primeiras audições de fonogramas foram tidas como “sessões de alta magia”, nos primeiros anos do século XX a implantação em Portugal do som gravado como mercadoria terá sido percepcionada no mainstream como coisa de excêntricos. Essa é a explicação mais plausível para o enigmático “cenário de invisibilidade”, assinalado por Leonor Losa: o absoluto silêncio que as fontes da época devotaram à indústria do disco então nascente, mas a qual, paradoxalmente, era alvo de profusa publicidade paga nos principais jornais e revistas pelos editores de Lisboa e Porto, dinâmicos lojistas representantes das grandes marcas internacionais, que periodicamente enviavam os seus técnicos em missões a Portugal, para sessões de gravação em espaços improvisados.

Sem um inventário fonográfico nacional, a história da implantação da indústria fonográfica foi quase absolutamente ignorada até hoje — porventura por ser considerada “de pequena escala” e por isso pouco relevante do ponto de vista historiográfico, apesar de, como comprova esta notável monografia, o fenómeno ter envolvido um comércio florescente, a adesão de inúmeros artistas, músicos, artistas de teatro e de revista e bandas filarmónicas, cujo absoluto anonimato persistiu.

Quem sabe quem eram cantores/actores pioneiros, com dezenas de peças comercializadas, como Isabel Costa, Duarte Silva, Medina de Sousa, Manassés Lacerda, ou Reinaldo Varella (que terá sido professor de música do Rei D. Carlos)? Talvez, arrisco eu, que os discos desse período tenham sido equiparados aos “rolos” com temas para as pianolas e as “caixas de música”, artefactos mecânicos tão populares nos séculos XVIII e XIX, que também não constam dos “discursos públicos”, nem eram considerados “produtos culturais”.

Para quem nasceu nos anos 1960, em pleno boom da indústria fonográfica — quando a importância dos seus actores, principalmente os artistas, foi reconhecida política e socialmente, alguns quase idolatrados — a irrelevância concedida aos seus “antepassados” revela-se no mínimo incompreensível, mesmo descontando a precária condição do som e a duvidosa qualidade artística de grande parte das realizações. Esse desinteresse é tanto mais de estranhar quanto afinal o fonograma, um pouco como a fotografia, sua contemporânea, constitui uma inestimável fonte primária de época.

Nesse sentido, esta preciosa obra de Leonor Losa destaca-se por colmatar uma grande lacuna, ao ensaiar os primeiros passos no enquadramento biográfico de alguns dos artistas pioneiros desta indústria.
Bem organizado, o livro estrutura-se em três partes principais: começa com a “Implantação do Mercado de Fonogramas em Portugal”, que aborda o impacto das tecnologias em Portugal e as lojas e lojistas pioneiros na constituição de uma economia de mercado local; a segunda parte, “Música Gravada como Prática Social”, aborda a génese das categorias da música gravada (teatro, humor, cançoneta e fado) e o reconhecimento social das “machinas fallantes” que definitivamente não eram chics no país de 1900. Finalmente, porventura a parte menos interessante, porque mais conhecida, incide na industrialização do sector a partir da gravação eléctrica que cresce com o cinema sonoro, os dias da rádio e o nascimento do star system nacional, que estabelece o protagonismo dos intérpretes, enfim o estrelato tal como o conhecemos.

Não posso evitar uma nota sobre o deslumbramento pelo 5 de Outubro de 1910, que a autora expressa em repetidos pontos da obra, e que a leva a associar, sem fundamentos, o advento da actividade e comércio fonográficos à mudança do regime da chefia do Estado, como por exemplo: “a instalação da república implicou a valorização de estratos sociais até então apartados da aristocracia dominante durante a monarquia” (v. pp. 162) ou, dito de outra forma, “Se concluirmos que, nas décadas anteriores, a música gravada fazia parte das práticas sociais de uma classe intermédia, cultural e socialmente diferentes das classes dominantes, não será despropositado associar o reposicionamento social das mercadorias fonográficas ao processo mais alargado de reposicionamento social da classe média urbana no período que sucedeu a implantação da república” (p. 216).

Esta boutade talvez colha créditos de historiadores politicamente engajados como Fernando Rosas ou Fernanda Rollo (comissária das celebrações do centenário da república portuguesa), que Leonor Losa cita recorrentemente, mas estas suposições — estranhas a um trabalho académico — são afinal tão especulativas quanto atribuir directamente a retracção do mercado fonográfico na década de 1910 à constante perseguição à imprensa, repressão dos movimentos sindicais, redução de 70% do eleitorado, violência nas ruas e exclusão explícita das mulheres da vida cívica que a revolução acarretou.

Ao contrário, o que parece mais evidente, do ponto de vista histórico, é que terá sido o imparável processo de decadência da velha aristocracia e a democratização ocorrida na crescente sociedade urbana durante a monarquia constitucional de 1834-1910 a dar lugar a uma renovada burguesia de prósperos industriais, comerciantes e funcionários do Estado. Afinal, em 1900 — quando já prosperavam em Lisboa a Casa Santos Dinis, e no Porto o Centro Phonográfico Portuguez de Ricardo Lemos (p. 37) — morria Eça de Queiroz, que sobre a república havia dito anos antes: «O Partido Republicano em Portugal nunca apresentou um programa, nem verdadeiramente tem um programa. Mais ainda, nem o pode ter: porque todas as reformas que, como Partido Republicano, lhe cumpriria reclamar já foram realizadas pelo liberalismo monárquico.»

Apesar disso, a edição deste livro constitui, sem qualquer dúvida, um marco. Que inspire outros investigadores, e sobretudo desperte o interesse do público em geral, ou ajude a elucidar mais um curioso como eu, que um belo dia me vi seduzido por este fascinante mundo dos sons antigos, ao descobrir numa arrecadação de família um velho fonógrafo de Edison com dezenas de cilindros de cera, que depois de reabilitado, pôde encantar-me com ecos de ambientes e sonoridades do tempo dos avós dos nossos avós.

Texto original da recensão publicada no Observador

A prova cabal de que há uma conspiração contra mim é quando:


  •  Preciso de imprimir um trabalho e encontro a impressora sem papel e depois o agrafador sem agrafes. 

  • Os meus clientes mais importantes me ligam para o telemóvel estando eu na casa de banho.

  • Ao desligar o "portátil" com pressa para sair do escritório o sistema operativo inicia uma interminável série de actualizações.