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João Távora

O dilema

Com o País à beira da falência o governo José Sócrates foi obrigado a assinar um pesado caderno de encargos para que uma tragédia fosse travada.

Em clima de emergência, os danos do violento ajustamento e cortes no Estado esvaziaram muitos bolsos, aqueceram emoções e conduziram a um clima de pré-guerra civil.  
Sabemos como há poucos temas que provoquem mais alarme social que os relacionados com a saúde. E que o sofrimento alheio é um espectáculo tão sedutor quanto intolerável se não for controlado e causado artificialmente para um ‘reality show’. Depois, numa civilização de génese cristã uma pessoa é uma pessoa, uma vida é uma vida, única e irrepetível, e como tal um incontornável problema moral para quem tem responsabilidades na gestão da coisa pública.
Dificilmente um sector sensível como o da Saúde podia ter passado incólume à crise da dívida. Mas quero crer que as disfunções detectadas estão sentenciadas a ser rapidamente sanadas. É nossa condição civilizacional.

 

Publicado originalmente no Diário Económico

A propósito da Grécia

Se o Siryza não ceder aos governos  parceiros da União Europeia e assumir a saida do Euro parece-me evidente que condena os gregos a um ajustamento tremendamente mais brutal que  colocará ainda mais em evidência as ineficiências da sua economia. Não sei até que ponto a sua  estratégia "neo-orgulhosamente-sós" resistirá ao desespero causado pelo consequente radical  empobrecimento das pessoas, com os bolsos cheios de Dracmas sem qualquer valor. 

De resto, no que refere ao entusiasmo de alguns "nacionalistas" com a situação, confesso que não nutro um grande "orgulho" pela Pátria assim em abstrato (aliás muitos dos seus traços e história provocam-me apreensão e amargura), antes corre no meu sangue um amor vivo e profundo a Portugal, que sendo verdadeiro é responsável e exigente. O sentimentalismo patriótico é normalmente semente de brutais tiranias e grandes desgraças.

Amarrados

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Amarrados a um tratado orçamental, a uma moeda "estrangeira" e sem margem de manobra, é irónico que desta vez os partidos de governo se apresentem a eleições valorizando o debate dos seus programas no lugar dos tradicionais e vazios slogans.

Aproveita aos portugueses o curso de economês tão intensivo quanto involuntário ministrado nos últimos cinco anos. O que separa o programa socialista do da coligação são as suas "boas intenções" ideológicas - mais estaticistas por um lado e mais liberais por outro, que serão sempre dissolvidas pela tirania da realidade: uma dívida tão pesada quanto um inadaptado tecido social, ainda viciado num agonizante modelo económico. 

Como se não bastasse uma constituição socialista, quaisquer reformas liberalizantes esbarram nessa sociedade civil temerosa e infantilizada por um ancestral paternalismo centralista. O que nos salva é que as dispendiosas "reposições" prometidas pelo Largo do Rato, sobre o olhar atento dos credores, se circunscreverão a uma ou outra medida de cariz meramente simbólico.

Artigo publicado originalmente no Diário Económico.

Até sempre Tio Manel

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 Manuel Pedro de Carvalho Gomes de Castro

1944 - 2015

Se somos moldados pelas contrariedades que enfrentamos, também é certo que somos feitos das pessoas que amamos. Isso é um consolo. Porque a pessoa só o é na sua relação com os outros, porque nós somos sempre muito mais em comunidade: seja a dos antepassados que partilhamos, das cores que elegemos, dos tiques e afeições que comungamos. 

Vêm estas palavras a propósito da grande dor que me vem causando a partida do meu Tio Manel que hoje se junta ao Criador. Um pouco de nós próprios morre com os amigos de quem não nos conformámos ver partir. Talvez isso facilite o culminar da nossa própria peregrinação terrena. Além disso, acontece que um tio, um bom tio, é uma instituição familiar preciosa, insubstituível: a testemunha privilegiada de que os nossos pais não são uns extraterrestres. Porque um tio tem a vantagem de reflectir os valores da nossa família sem o “peso” das responsabilidades parentais que tanto condicionam o “convívio”. O Tio Manel era isso tudo, soube ser isso tudo, pôde ser isso tudo: tendo casado tarde e não tendo tido filhos, construiu uma extraordinária reputação com os muitos sobrinhos que lhe foram surgindo ao caminho pela vida fora.

Isso explica-se mais ou menos assim: quando estava na casa dos meus avós na Avenida da Liberdade a passar uns dias, com o Tio Manel também tinha que ir à missa, mas depois íamos espraiar as emoções para Alvalade. Ou para a Costa da Caparica. Com Tio Manel dei o primeiro golo de cerveja, conheci o cheiro da cigarrilha e aprendi o sabor da Água de Castelo. Ao seu lado na bancada do antigo Estádio de Alvalade, ou no seu mini cor-de-vinho, aprendi quando um homem deve viver a frustração em silêncio. Éramos muito diferentes, bem sei. Mas com ele apreendi a maior lição da vida, a da coragem e perseverança: cumpriu a tropa nos anos na guerra do ultramar, assunto de que nunca o ouvi falar; a seguir agarrou com as duas mãos um modesto emprego numa companhia de seguros, do qual construiu com tenacidade uma vida digna (e como isso é importante, apesar da vulgarização da palavra). Agora, a este ponto da vida fico com a ideia que a reforma faz mal à saúde das pessoas. De cada vez que nos tempos mais recentes nos encontrávamos em Alvalade ficava a ideia que os anos lhe pesavam cada vez mais, quase lhe levavam o proverbial bom humor. 
Falta uma referência ao Sporting, que amou como poucos e que lhe fica em dívida pela enorme fidelidade que sempre dedicou ao clube do seu coração: esse é um legado de que me orgulho e que em mim tem a sua assinatura. 
Nascido em 1944 em casa aos seis meses de gestação com pouco mais de seiscentas gramas, diz a lenda que sobreviveu envolvido em algodão em rama à conta de insistentes exercícios de ginástica respiratória. Onde quer que esteja, por todas as razões, o Tio Manel será sempre um grande Campeão. Deus o tenha na Sua infinita Glória.

 

O bom filho à casa torna

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Desde a surpreendente contratação de Mário Jardel que o Sporting não gerava semelhante impacto mediático. A contratação de Jorge Jesus de que já se falava mas ninguém acreditava constitui uma assombrosa notícia que ecoa das bocas dos portugueses incrédulos pelas ruas, cafés e empregos por esse hiper-mediatizado Portugal profundo que há muito perdeu a  inocência. As notícias que circulam da rede à velocidade da luz para o bolso ou secretária dos portugueses antes de chegarem aos escaparates dos quiosques são mais marcantes pelo espanto que causam do que pela substância que podem espelhar. É a civilização “Jornal do Incrível”. Nesse sentido a transferência dum lado para o outro da 2ª Circular do incontornável personagem nacional Jorge Jesus por Bruno de Carvalho é um golpe de mestre. Se, como tudo indica, o golpe significar uma injecção de capital que potencie a competitividade do plantel leonino. Se, como queremos acreditar, Bruno de Carvalho se souber entender com o novo treinador quando a pressão apertar... Se assim for, na pior das hipóteses, esta história significará simplesmente um estrondoso regresso do filho pródigo.

 

Publicado originalmente aqui

Um sonho

Hoje o meu filhote pequeno veio da escola dócil, meigo e corado, até viu as notícias, a chegada da equipe do Sporting com a taça à varanda da Câmara de Lisboa e assim, cúmplice encostadinho a mim.
Pena que esteja com febre.

Idílico

Hoje o meu filhote pequeno veio da escola dócil, meigo e corado, até viu as notícias, a chegada da equipe do Sporting com a taça à varanda da Câmara de Lisboa e assim, cúmplice encostadinho a mim.
Pena que esteja com febre.

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