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João Távora

Como a peste

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Emerge por estes dias um discurso catastrofista a propósito das "redes sociais", "pós verdades", "notícias falsas", "populismos" como se fossem novas pestes, o fim do mundo em cuecas. Assim se referiu a essas pragas José Pacheco Pereira que por motivos insondáveis adoptou nos últimos anos um discurso contra tudo, em especial a realidade que teima em não o compreender. Quando certas personagens como Pacheco Pereira se insurgem contra as redes sociais e os perigos do anti-intelectualismo – todos ignorantes todos iguais, a minha leitura da realidade vale tanto como a tua - a coisa soa-me a ressabiamento e ciumeira pura.

Hoje foi a vez de Miguel Sousa Tavares, um tipo porreiro que não consta ser um perito em coisa alguma, antes pelo contrário, tecer na sua coluna do Expresso pela enésima vez um rol de lamúrias e alertas sobre os perigos e a perversão acrescida do conluio entre os jornais e os media sociais. As pessoas com a idade se não se cuidam podem tornar-se amargas, já se sabia.

Convém relativizar o alarmismo acicatado pelas vitórias “populistas” no seu confronto com o politicamente correcto veiculado pela imprensa tradicional em dificuldades. Afinal o populismo (veicular o que é popular) sempre existiu - vejam-se os casos extremos dos discursos do PCP e do Bloco de Esquerda ou do PS durante o resgate da Tróica –  e não é mais que o discurso fantasioso de conquista de popularidade àqueles que se quer apear e as notícias falsas simples munições de propaganda, a mais antiga profissão do mundo a seguir à outra - e Pacheco Pereira conhece-a bem. Mas se tudo isto são notícias más que perturbam os nossos tempos, a boa notícia é que elas sempre existiram sob outras capas e formas. Não nos consola nada, mas a ignorância e a imprevidência na interpretação da realidade é um problema antigo. Que o Mundo é um local perigoso e que a escolaridade não erradicou a ignorância também não é novidade. Está visto que “quando todos morrermos da peste só ficarão na Terra os próprios Sousa Tavares e Pacheco Pereira”*. Entretanto, eles que aproveitem bem o palco que têm para proferirem livremente as suas generalidades.

* Frase de João Villalobos, um perigoso propagandista no Facebook.

O diabo à espreita

Marcelo é inteligente ao cavalgar o inédito período de paz social e de domesticação das esquerdas radicais (e dos sindicatos, por consequência) que lhe caiu do céu. Mas desconfio que o seu frenesim comece a virar-se contra si próprio a breve trecho. E aqui entre nós, o diabo está mesmo à espreita.

O factor humano

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Foi na quinta-feira passada que me desloquei a Coimbra, ao Tivoli, por ocasião da festa de Natal do hotel em que se celebravam os 25 anos da sua abertura, na qual numa outra vida eu participei. Foram momentos comoventes em que revi colegas e amigos de longa data passados num almoço que reuniu todo o pessoal do hotel no restaurante habitualmente exclusivo para os clientes.

Poucas pessoas terão a noção do que significa pôr um hotel acabado de construir a funcionar, e menos ainda da importância que para isso tem o factor humano. Tão importante como o edifício, o seu requinte, design e comodidades, são os diversos grupos de pessoas que, como formiguinhas, trabalham com mais ou menos discrição 24,00hs sobre 24,00hs nas ribaltas do grende "cenário".  Movem-se pelas zonas de serviço como as cozinhas, copas, andares, serviço de quartos, economatos, manutenção, escritórios de reservas, contabilidade ou comerciais; sem falar das equipas que dão a cara perante os hospedes e visitantes nos balcões dos bares, das recepções e portarias, ou a servir às mesas, na reposição das comidas, etc., etc. Um hotel é um microcosmos composto por uma larga equipa de dezenas ou centenas de pessoas, heterogenia e interclassista, por uma questão de disciplina e eficiência muito hierarquizadas. Integrados em equipas, certo é que todos os colaboradores se movem por resultados exigentes e cruzam-se nas zonas de serviço, balneários, refeitórios e sala de convívio, partilhando refeições e momentos de lazer entre os turnos, como se o hotel fora a sua segunda casa, uma casa onde se passa muito tempo, se vivem emoções fortes, frustrações e alegrias, tensões que geram conflitos e cumplicidades que se fazem amizades, como se o trabalho fora uma inevitável segunda família.
A gestão dos recursos humanos é por tudo isto o maior desafio na boa administração dum hotel. É o factor humano que ao longo do tempo imprime uma “cultura” própria à empresa, que pode cativar ou repelir o cliente. Se o marketing determinado para uma marca define um certo "carisma", as pessoas que o aplicam, no relacionamento entre si e com o cliente, vão ser sempre determinantes e condicionar o resultado.

Foi a trabalhar nos hotéis que depois de passar por diversas funções e experiências descobri a minha profissão de Relações Públicas e mais tarde de Marketing e Comunicação em que hoje trabalho. A maior parte dessa experiência de vida adquiri-a ao serviço dos nos Hotéis Tivoli, uma marca com história e genuinamente portuguesa, com um carisma muito forte, onde o factor humano foi sempre valorizado.

A cadeia de Hotéis Tivoli têm origem na Pensão Tivoli na Avenida da Liberdade fundada no final dos anos 20 da associação entre os empresários José Cardoso e Joaquim Machaz. Estes dois empreendedores construíram uma marca incontornável na história da indústria hoteleira portuguesa. Depois de várias reformulações, a partir dos anos oitenta o grupo passou pelas mãos de diferentes accionistas até chegar aos dias de hoje em que o grupo hoteleiro foi resgatado  pelos tailandeses da Minor. Certo é que o seu principal capital sempre esteve nos empregados e na cultura que geraram ao longo de décadas. Por isso não foi surpresa para mim quando na quinta-feira em Coimbra me senti parte de uma grande família que não esquece os seus. Também eu não esqueço todos os amigos que lá deixei. 

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Uma Renascença renascida

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Desde sempre um amante fascinado pelo fenómeno da rádio, em boa hora me chamou à atenção a nova dinâmica evidenciada pela Rádio Renascença que vem transformando não só a sua grelha de programação, mas a sua estratégia de comunicação: agora, o principal canal do Grupo Renascença parece finalmente interessado em alcançar um público cosmopolita que, sem preconceito contra a religião católica, procura estar a par da agenda política económica e social do país. Apresentando de forma muito dinâmica nos períodos de prime-time conteúdos de índole informativa, com notícias, transito, desporto, comentários e entrevistas a propósito dos temas candentes de sociedade e agenda política nacional e internacional, intercalados com apontamentos de música mainstream nacional e anglo-saxónica, a rádio Renascença assume por estes dias um posicionamento inédito, renovado e comercialmente afoito. Mas se essa mudança é a principal novidade desta rádio que se prepara para festejar os oitenta anos de existência, não menos interessante é de assinalar a inclusão nos radio-jornais de notícias de relevância sobre a Igreja com sintéticos comentários de especialistas, que assim, numa forma natural abrange um público muito mais alargado - e não apenas os cristãos convertidos, como antigamente sucedia, em pesados programas a eles destinados. Tudo isto parece-me tanto mais interessante quanto, em termos relativos, a rádio vem ganhando relevância no meio do modelo clássico de broadcasting e do jornalismo tradicional em acentuada decadência em virtude da sua inadaptação ao fenómeno da Internet e do advento dos média sociais. Não deixa de ser interessante que perante este panorama bastante adverso, a rádio apresente valores de audiência diária acima de 50% por cento da população (54,4% de "Audiência Acumulada de Véspera" segundo dados de Setembro último da Marktest é o número ou percentagem de indivíduos que escutaram uma estação, no período de um dia, independentemente do tempo despendido). E não deixa de ser curioso que o Grupo Rádio Renascença, uma rádio católica, dispute a liderança das audiências com 35,4% de share com o Grupo Média Capital com 35,5%. De resto, curioso parece-nos também o confronto entre a Radio Renascença que ostenta 8,2% de share contra os 5,7% da Antena 1 e os 2.9% da TSF, estações suas concorrentes directas.

Estes números significam uma responsabilidade acrescida que pesa sobre a Emissora Católica Portuguesa de se posicionar de forma consequente no espectro de oferta radiofónica nacional como uma verdadeira alternativa à fórmula laicista, relativista e politicamente enviesada com que a generalidade dos média de referência lêem o Mundo e a sua complexidade. Parabéns à Rádio Renascença, e que lhe não aconteça o fenómeno do árbitro que confrontado com a tarefa de arbitrar um desafio que envolva o seu clube de eleição, para calar as dúvidas sobre a sua isenção, acaba favorecendo o adversário.

 

Texto publicado originalmente aqui