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João Távora

Homenagem ao meu Pai, D. Luís de Lancastre e Távora

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Aqui publico um testemunho pessoal sobre o meu Pai, D. Luiz Gonzaga de Lancastre e Távora, Marquês de Abrantes, partilhado por ocasião da sessão evocativa dos 25 anos sobre sua morte organizada pelo Instituto Português de Heráldica no dia 21 de Fevereiro de 2018. Esta sessão, que será em breve disponibilizada em video e numa separata da revista Armas e Troféus, contou com as substanciais intervenções do presidente honorário do IPH Dr. Pedro Sameiro que apresentou um panorama da obra do homenageado, da Prof. Doutora Maria do Rosário Morujão sobre a sua dimensão sigilográfica, e finalmente do Dr. Carlos Bobone que recordou o homenageado numa dimensão mais pessoal. (Ver reportagem fotográfica aqui e registo vídeo aqui)

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Minhas Senhoras e meus Senhores:

 

Antes de mais quero agradecer ao Instituto Português de Heráldica na pessoa do seu presidente o Dr. Miguel Metelo Seixas, este tributo ao meu Pai, D. Luís de Lancastre e Távora, XI Marquês de Abrantes, que com grande entusiasmo acolhemos desde a primeira hora, e que constitui uma muito justa iniciativa de rememoração da sua vida e obra, agora que se completam 25 anos da sua partida e de nossa saudade. Gostava de realçar a grande emoção e gosto especial que tive a elaborar as linhas que aqui vou partilhar, que são uma sentida homenagem que aquando da sua morte não pude prestar.

De resto, relembrar as pessoas que amamos ou admiramos constitui um reconfortante perpetuar da sua companhia, e nesse sentido, nós todos fomos privilegiados com o seu legado bibliográfico, cujas páginas constituem a cada momento uma oportunidade de reencontro, que tem o poder de nos devolver uma calorosa proximidade com o seu autor.

Sobre o seu legado científico e historiográfico, outros falarão melhor que eu, mas no entanto gostaria de relevar um dado importante que o meu tio Duarte de Castro, cunhado e amigo de juventude do meu Pai, referiu um certo dia não muito distante: poucos terão sido os marqueses de Abrantes seus antepassados a prestigiar de forma tão efectiva e brilhante esta Casa que com tanto orgulho e denodo o meu Pai representava.

De facto, apesar de ter vivido toda a sua vida adulta uma precaridade financeira que tanto o amargurava, o meu Pai nunca deixou de ter presente uma forte noção do serviço que o seu estatuto comportava, tendo para isso empreendido uma vida de trabalho e investigação que ousou dispor ao serviço dos outros, tornando-se uma incontornável autoridade em genealogia e heráldica que se reflecte na larga produção bibliográfica ainda hoje reconhecida e respeitada.

Permitam-me agora revelar alguns aspectos biográficos do meu Pai, porventura não tão conhecidos:

Nasceu no dia 8 de Fevereiro de 1937, num dia de Carnaval. Foi filho terceiro e primogénito varão de D. José Maria da Piedade de Lancastre e Távora, e D. Maria Emília Casal Ribeiro Ulrich, que viviam então no 2.° andar de um prédio na Calçada da Estrela que ocupavam desde o seu regresso do Luxemburgo em 1935 aproveitando a paz social permitida pelo fim da 1ª república.

Foi baptizado na Igreja de Santos o Velho, tendo sido seus Padrinhos D. Pedro Maria da Piedade de Lencastre e Távora, III Conde de Alvor, irmão mais novo do seu pai e meu Avô José, e Nossa Senhora da Piedade como era tradição ancestral na família, tendo tocado como Madrinha D. Maria Cecília Van Zeller de Castro Pereira.

No meu Pai foi investida uma educação esmerada: para tal, foi educado em casa por uma "Mademoiselle" até aos 9 anos, a Sra. D. Maria Lucília Moniz, uma velha senhora dos Açores contratada para a sua instrução e com quem confessou ter criado uma forte ligação.

Apesar de tudo, nunca foi brilhante nos estudos, característica que segundo o próprio escreveu “entristecia os seus pais” e era realçada pelo facto das suas irmãs mais velhas serem brilhantes alunas.

A justificação dada pelo meu Pai, no projecto de memórias que infelizmente deixou a meio e que me permito utilizar para estas notas, para este insucesso terá contribuído o facto de, em 11 anos lectivos, da Instrução Primária ao Liceu, ter mudado, nada mais nada menos, do que 13 vezes de estabelecimento de ensino.

Tinha boas notas a português, francês, inglês e alemão, literatura e história, e ainda citando as suas palavras, “o pior defeito como estudante, era apenas aplicar-se nas cadeiras de Letras”, que eram as que verdadeiramente lhe interessavam. Entre as disciplinas de Ciências, só no desenho conseguia manter uma média elevada.
De facto, um traço pouco conhecido do meu pai era o jeito que tinha para desenho – lembro-me bem dos retratos,  brasões, fardas militares, condecorações e aviões da II Guerra Mundial entre outros “bonecos” que desenhava com desenvoltura e precisão, com a mesma caneta de tinta permanente com que compunha os seus manuscritos, numa letra muito bem traçada em folhas de papel almaço quadriculadas. A esse facto não seria alheio o gosto que nutria desde cedo por Banda Desenhada.

Foi entre os 3 ou 4 anos que se mudou para a Travessa do Patrocínio n.º 15 na Estrela, a casa que os meus irmãos e eu tanto frequentámos na nossa infância e nos deixou tão gratas recordações.

Durante o Verão passava um mês de férias na Praia das Maçãs, e aos 11 anos, pouco mais ou menos, passou um Verão em Santo Amaro de Oeiras. Foi a partir dos doze que, com a família, passou a ir para a casa Burnay na Ericeira, que meus avós mantiveram alugada na época estival até 1962.

Tendo desistido de estudar aos vinte anos, empregou-se na Cidla, com um ordenado de 800 escudos por mês, máximo que então ganhava um aspirante a 3.° escriturário.

Casou-se a 10 de Outubro de 1959 com 22 anos com Maria João de Carvalho Gomes de Castro (a minha mãe aqui presente), tendo sido seus padrinhos António Lavradio e o seu Tio José Frederico Ulrich; as madrinhas da minha mãe foram a minha bisavó Valentina, Condessa de Castro, e a Senhora Infanta D. Maria Adelaide de Bragança. O copo d´água foi servido na casa dos seus sogros, no 232 da Avenida da Liberdade, de boa memória para quem o frequentou.

O meu Pai tinha alguns gostos pessoais curiosos que cometo a inconfidência de aqui partilhar: com um sentido de humor apurado, se possível não perdia um desenho animado na televisão, fosse do Bip Bip, Bugs Bunny, Flinstones ou outra série, não sendo raro encontrá-lo a rir a bandeiras despregadas. Era um fervoroso amante de ficção científica e de contos policiais que consumia com grande voracidade – na verdade os pequenos livros da colecção Argonauta e Vampiro espalhavam-se pela nossa casa aos magotes. Como pessoa de bom gosto que era, foi um Sportinguista sofredor, e apreciava ver um jogo de futebol da sua equipa desde que fosse no sofá. A sua maior fraqueza sempre terá sido a gulodice: não resistia a doces, principalmente de ovos, e a outras sofisticadas iguarias que o próprio se dedicava a confeccionar para a família com muita arte e engenho, e que depois se deliciava a degustar com não menos dedicação. Este facto, aliado à sua grande estatura, faziam do meu Pai o homem proeminente que todos conhecemos, e doente do coração como era, o desfecho da sua morte precoce para muitos não foi surpresa.

Apesar de ser um tradicionalista convicto, foi precursor duma paternidade afectivamente muito próxima e empenhada: não se eximia da expressão dos seus afectos e de brincadeiras com os filhos, e estou convencido que com isso nos deixou a todos uma marca indelével. Apesar das suas contradições e das suas emoções à flor da pele, com que por vezes nos assustava, prevaleceu na minha memória um Pai carinhoso e muito amigo. Que não se poupou a nos incutir o gosto pela boa música, pelo fascínio de uma boa história e por um bom livro – lembro-me com saudade, numa idade precoce, de ele nos ir ler ao quarto, “As Minas de Salomão” traduzido por Eça de Queiroz e o Principezinho de Antoine de Saint-Exupéry.

Da sua música lembrar-me-ei sempre dele quando ouça a Abertura de 1812 de Tchaikovsky, Jaques Brell que adorava quase toda o reportório e as canções mais conhecidas de Peter, Paul and Mary, a sua maior ousadia em termos de música Pop que deplorava em geral.

Dois filmes que sempre me lembrarão o meu Pai são o galardoado Lawrence da Arábia e o Breakfast at Tiffany's baseado numa novela de Truman Capote com a belíssima Audrey Hepburn no seu auge. Com o meu pai passei também longas e entretidas horas a jogar Xadrez que jamais esquecerei.

Uma nota final sobre a descoberta que recentemente fiz no livro “Nas teias de Salazar” – uma biografia de Dom Duarte Nuno de Bragança da autoria de Paulo Drumond Braga: nele, na página 282, menciona-se um desentendimento entre o meu Pai e o Duque de Bragança em 1966, quando o primeiro, descontente com a nomeação de João Ameal para dirigir as operações da transladação do Rei Dom Miguel, se atreveu a escrever para S. A. R. uma carta em que o designava a si nesse papel e que Dom Duarte Nuno se recusou assinar com manifesto desagrado. Este caso parece-me curioso, pois na minha interpretação, remete para o voluntarismo do meu Pai, revelador de alguma ingenuidade natural da sua juventude, com o propósito de assumir um protagonismo que julgava legítimo, numa velha causa historicamente acarinhada pela Casa de Abrantes – a do Rei Dom Miguel I, personalidade histórica a que aliás dedicara já uma série de artigos publicados na revista Debate, dois anos antes deste mal-entendido com o Chefe da Casa Real.

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Espero que estas pinceladas, algumas delas certamente subjectivas, tenham contribuído para definir melhor o perfil do XI Marquês de Abrantes, meu saudoso Pai. O que ficou da nossa convivência foi uma sua presença muito forte na minha consciência. É com ele que ainda hoje confidencio muitas das minhas pequenas conquistas e derrotas. Quero acreditar que ainda hoje o meu Pai lá de cima me acompanha nos meus passos. E concorde que as nossas disputas, encontros e desencontros, afinal valeram a pena - foram fruto de um grande amor.

Que Deus o guarde na sua infinita misericórdia, e o reconforte das duras provações que passou em vida, é uma oração que aqui deixo e com que termino este testemunho.


Obrigado a todos,

 

21 de Fevereiro de 2018
Convento do Carmo, Lisboa, 

Bruno de Carvalho outra vez

Confesso que já não consigo disfarçar com os meus amigos o enorme embaraço que Bruno de Carvalho constitui para mim. O homem envergonha-me como sportinguista que sou. Mas o mais grave é que sua permanente incontinência verbal tenha conseguido desviar a atenção da imprensa de um presidente rival que é arguido e da investigação judicial do caso dos e-mails que esse sim é um verdadeiro escândalo nacional – Em vez disso os dislates de Bruno de Carvalho fazem o pleno em notícias negativas e artigos de opinião e editoriais, até nos chamados jornais de referencia. Como se fora uma autêntica conspiração orquestrada por… si próprio. Se o objectivo é ter toda a Comunicação Social e os seus profissionais, mesmo que sportinguistas, com má vontade ao Sporting, penso que o intento foi conseguido com o estúpido apelo lançado na Assembleia Geral de Sábado. Para mais fica por saber que ilações vai tirar Bruno de Carvalho da desobediência dos comentadores que permanecem nos painéis de debate nas televisões e dos milhões de sportinguistas que continuarão a ler jornais e a ver TV como habitualmente. 
A boa notícia é que Jorge Jesus conseguiu manter a equipa blindada e protegida da irracionalidade do discurso do presidente – ontem ganhámos numa demonstração de garra e crer. O problema é que não consegue blindar os patrocinadores e os bancos de que o Sporting depende de tanta inanidade. Que assusta. Que me assusta.

O progresso encalhado

A exibição da série 007 que com diferentes actores protagonistas se mantém desde os anos cinquenta e que por estes dias podemos ver no Canal AMC comprova-o: o mais relevante progresso tecnológico dos últimos 40 anos tem que ver com os “efeitos especiais” no cinema. De resto, tirando o tratamento da informação, a sua portabilidade e a robótica (coisas de duvidosa utilidade), as mais decisivas realizações tecnológicas são já antigas – a última ida do Homem á Lua aconteceu nos anos 70, e desde então a duração de uma viagem de avião entre Lisboa e Nova Iorque não tem progressos significativos, assim como os standards da Alta-Fidelidade ou da locomoção automóvel. Há mais de quarenta anos que o progresso encalhou e vivemos iludidos pelo circo digital.

O sacramento do matrimónio

Há cerca de vinte anos, quando a minha mulher (com dois filhos pequenos) e eu decidimos constituir uma família, não nos passou pela cabeça exigir que a Igreja se adaptasse às nossas conveniências ou ao nosso “sentimento de (in)justiça”. Uma semana antes de consumarmos civilmente essa nossa decisão "fracturante", celebrámos com os amigos chegados uma inesquecível Missa de Acção de Graças na Capela das Amoreiras – foi a última vez durante muitos anos que tomamos o sacramento da comunhão. Durante esse tempo, nunca deixámos de ir à missa, participar na vida da paróquia e dar uma educação católica aos nossos filhos; e foi com humildade e sem ressentimentos que nos juntámos a um grupo de "casais recasados católicos" as “Equipas de Santa isabel" do Cónego Carlos Paes da Paróquia de S. João de Deus, para a catequese e crescimento espiritual em casal. Antes como agora, a Bolota e eu desejamos ardentemente que a Igreja permaneça guardiã do valor supremo da perenidade da família natural como aliança fecunda, sagrada e indissolúvel, construída sobre a rocha. Um núcleo vital para a realização de uma comunidade verdadeiramente livre e pujante.

E o Louçã que não gosta de contos de fadas...

É uma tentação irresistível, mas de vez em quando um descendente ideológico de Afonso Costa, esse impoluto “democrata” que depois de 1910 com os seus capangas encheu as prisões indistintamente de monárquicos e sindicalistas, que restringiu o direito de voto da população, fazendo a percentagem de cidadãos votantes descer de 75% para 30%, tem de vir dar prova de vida a perorar contra a Instituição Real. Desta vez foi o Reverendo Louçã, inspirado pelo "Podemos" de nustros hermanos que se impressionou muito com o agraciamento da Infanta Leonor, a princesa herdeira do trono de Espanha, com o Tosão d’ Ouro, uma ordem dinástica atribuída muito restritivamente, tradicionalmente recebida pelo herdeiro da coroa espanhola em tenra idade. Curioso é perceber que republicanos como Louçã aprofundam tanto os seus estudos de genealogia - e, no caso, da pureza das linhagem dos Bourbons - mas fingem não perceber como a Instituição Real em Espanha é muito mais do que “um conto de fadas para revistas cor-de-rosa”: quando necessário foi garante da democracia e da Constituição, mas acima de tudo é sustentáculo contra a desagregação da Espanha. Aliás, conhecendo as causas do sacerdote Louçã, logo se descobre que "desagregação" é a palavra-chave da sua agenda, e fica-se desconfiado com o seu papel no Banco de Portugal ou de Conselheiro de Estado. A desagregação da Europa, a desagregação das Nações, a desagregação da democracia liberal, a desagregação das empresas, a desagregação da família, a desagregação da Igreja e de tudo que seja instituição fiável para o progresso de comunidades sólidas e livres. Entende-se porquê: esse caos de desagregação é o campo fértil, a única fórmula de conquistar gente revoltada e insatisfeita que se abalance para o seu projecto revolucionário do Homem Novo, como é exemplo vivo a Venezuela e as outras repúblicas tão ao seu gosto na sua juventude. No fundo, a coisa que mais frustra o Dr. Louçã são as monarquias europeias onde os revolucionários como ele jamais conseguiram por o pé em ramo verde, países em que a comunidade se revê nas suas resistentes instituições, e por isso sempre alcançam a prosperidade. Infelizmente para nós, em Portugal dão-lhe demasiado protagonismo. Porque será?

MariaFrancisca.jpg

Nota: pensei ilustrar este post com uma fotografia de Louçã, mas pensando bem, porque prefiro um conto de fadas a um filme de terror, escolhi a fotografia de uma princesa. Porque sou um patriota aqui fica a da infanta D. Maria Francisca que é por certo uma das mais bonitas da Europa.