Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

João Távora

Celebrar a vitória

capai.jpg

Apesar da ambiguidade provocadora (ou talvez por isso) acabo por gostar da capa do jornal i. Podíamos imaginar que teria sido engendrada para outro resultado da votação sobre a Eutanásia que era mais expectável. Mas não: eu prefiro acreditar que, pela cor e conteúdo, ela é celebrativa, festeja um desfecho. De resto a votação foi nominal a pedido (e bem!) do CDS. Daí me parecer pertinente a elencagem dos nomes dos deputados que se devem orgulhar do seu voto decisivo numa matéria tão sensível - num resultado assim tangencial cada um foi determinante. As reacções negativas dos meus amigos entendo-as à luz da costumeira discriminação negativa a que são sujeitas as ideias conservadoras pelos media. Isso não pode justificar uma “mania da perseguição” que é entrar no jogo do adversário. Já basta o que basta, temos de aprender a lidar com a vitória, saboreá-la e prepararmo-nos para os novos embates que nos esperam. É para isto que está destinado um orgulhoso e prudente conservador.

A morte como serviço público?

morte.jpg

Vivemos tempos estranhos quando o mesmo Estado que criminaliza os maus-tratos  aos animais e quer proibir o seu abate por razões de saúde pública, não só se recusa a criminalizar os maus-tratos a pessoas idosas como pretende agora oferecer a morte a pedido no menu do Serviço Nacional de Saúde. Vivemos tempos estranhos quando a morte a pedido nos é vendida como privilégio civilizacional garantido pelo Estado, o mesmo que não quer, não sabe, não consegue, garantir os direitos de um fim de vida digna aos seus cidadãos. Vivemos tempos estranhos quando o Estado pretende incumbir seres humanos encartados para matar outros seres humanos, justificando isso com a liberdade de um individuo. 

Essa máquina irá encarregar-se de gerir a conveniência dos pedidos de assassinato fundamentados em desesperos certamente inconcebíveis, com a ajuda de gabinetes de advocacia que se encarregarão de justificar dentro dos limites do quadro legal a conformidade do pedido do seu cliente ou a fundamentação da clinica perante casos extremos que considere atendíveis. Assusta-me viver num país que banaliza o valor da vida (inviolável segundo a Constituição), e cuja licitação poderá ficar ao alcance da apetência de cada um, e a morte um serviço garantido pelo Estado. Temos o dever de resistir.

Um choro pelo meu Sporting

Sportinh Luto.png

Foi ao início do recente derby, na cena macabra das tochas arremessadas para a baliza de Rui Patrício, que eu pela primeira vez na minha já longa vida me senti a mais no Estádio de Alvalade. Na sequência dos acontecimentos prévios, o estranho à vontade e o descaramento com que essa acção foi perpetrada, demonstrava à evidência como os bárbaros tinham definitivamente tomado conta do nosso clube.

Em minha defesa tenho a dizer que nunca votei em Bruno de Carvalho, cujo discurso e estilo desde a primeira hora me assustaram. Mas confesso que nos primeiros tempos da sua presidência, perante o facto consumado, e por causa do meu amor ao Sporting, tentei assimilar o personagem, desculpando-lhe os excessos com a esperança em resultados, e diga-se em abono da verdade que alguns sinais até pareciam prenunciar as almejadas vitórias. Pus-me em causa: talvez o problema fosse os meus preconceitos, uma pessoa que tivera uma rígida educação votada para uma estética (ou ética, como lhe queiram chamar) aristocrática, um exercício que a minha vida prática e quotidiana me obriga fazer demasiadas vezes. Infelizmente, como eu receava, a coisa vai acabar muito pior do que a minha imaginação alguma vez poderia conceber, mesmo nos mais negros pesadelos.

Esta semana tem sido muito penosa para mim. Basta dizer que não tenho maneira de explicar os insanos acontecimentos que tomaram conta do nosso Sporting aos meus filhos, que na antiga tradição familiar com orgulho formei como sportinguistas e para o carácter: sempre souberam que a condição do nosso amor e lealdade não eram dependentes ou recompensa de vitórias. Acontece que a dedicação de um verdadeiro Sportinguista é fundada no carácter que só o esforço forma, na resiliência e pele rija daqueles que perdendo batalhas se reforçam e reforçam para voltar à luta apenas pela glória que só um grande amor imprime. E a recompensa de uma pertença maior, legado que nos chegou das pessoas de bem que nos esculpiram este coração de Leão que hoje sangra e chora.

Vai dar muito trabalho, no meio dos escombros e deste caos que não nos deixa ver o dia de amanhã, juntar os cacos para voltarmos de cabeça erguida a competir pelo lugar que é nosso: o de um grande clube português, de gente decente e lutadora. O resgate do nosso Sporting tem de começar hoje, expulsando de vez o usurpador.

O Dia em que o Rei faz anos

Familia Real.jpg

Quis o destino que o chefe da Casa Real Portuguesa, o senhor Dom Duarte de Bragança nascesse naquele que é hoje oficialmente o Dia Internacional da Família. Por sinal, a Família Real Portuguesa constituiu a melhor propaganda para o modelo familiar tal como eu o usufrui: um projecto perene, crivo cultural com história própria, território protector do grande monstro igualitário da cultura dominante para a formação de seres críticos e livres.

De facto a família assim entendida atravessa uma profunda crise: cada vez há menos casamentos, no sentido da formação de novas “casas”. Segundo a Pordata, no ano passado, das poucas crianças nascidas, mais de metade terão sido fora do casamento. Também no meu círculo noto que são cada vez mais frequentes as relações amorosas “liberais” prolongadas, assumidas com um pé dentro e com outro fora da casa dos pais. Ironicamente são as famílias sobreviventes o porto de abrigo desses deambulantes jovens adultos, eternos filhos pródigos que adiam compromissos, por troca dum prato de lentilhas ou um smartphone de última geração, símbolo da sua “liberdade individual”. Toda a precariedade dos vínculos dos dias de hoje convida a uma sociedade de indivíduos isolados e frágeis com pertenças difusas, efémeras. 

É também em virtude da minha profunda crença num modelo de sociedade fundada em famílias livres e orgulhosas da sua história que eu sou tão convictamente monárquico. Nesse sentido os meus votos de parabéns ao senhor Dom Duarte é reforçado pelo orgulho que tenho na Família Real e que tão bem reflecte o modelo das minhas mais profundas convicções. Longa vida ao rei dos portugueses! 

 

Publicado originalmente no jornal i