Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

João Távora

Viveu depressa e afincadamente

Apesar da dura vida que teve em adulto e da precaridade financeira que tanto o amargurou pelos anos afora, o meu Pai nunca deixou de ter presente a forte noção do serviço que o seu estatuto comportava, tendo empreendido uma obra de investigação e produção intelectual ao serviço dos outros. Sobre ele escreveu o Carlos Bobone: «O Marquês de Abrantes viveu cedo. Nascido em 1937, casou aos 22 anos e foi pai aos 23. Aos 28 era pai de cinco filhos. Com 24 anos tornou-se chefe de uma das maiores casas titulares portuguesas, com 27 tomou posse do Arquivo da Casa de Abrantes e começou a publicar uma copiosa obra, que todos os anos foi enriquecendo. Aos 36 anos começou a escrever as suas memórias que se ficaram pelo preâmbulo e aos 56 anos morreu».

Pai_Brazao_Abrantes.jpg

Quando passa mais um ano sobre a sua partida, aqui partilho um trecho da crónica biografica que lhe dedico no livro "A Casa de Abrantes - Crónicas de Resistência" que publicarei em breve.

Da mesquinhice

sabado.jpg

 

A capa desta semana da revista Sábado chama-nos a atenção porque nos sugere um escândalo - se a Casa Real Portuguesa fosse rica (que não é) isso seria de citicar? Mas se formos ler o artigo no interior, constatamos que o conteúdo é quase inócuo, absolutamente desinteressante. São meia dúzia de páginas de pura bisbilhotice, em que não se encontra uma única “estória”, facto ou atitude dos Duques de Bragança digna de exploração jornalística (escândalo). Talvez a promoção gratuita do Nuno da Câmara Pereira que é um desqualificado, para certas pessoas consiga imprimir algum picante ao artigo.

Não, o problema da capa da revista Sábado não está num suposto jacobinismo do jornalista que entrevistou o Senhor Dom Duarte de Bragança ou da redacção da revista Sábado. O problema da concepção dessa capa está no potencial público que ela daquela forma insinuosa atrai e que em Portugal infelizmente tem algum peso: os ressentidos e os invejosos – é uma opção comercial, que diz tanto da revista quanto dos fregueses que pretende cativar.

Morgado da Póvoa

Póvoa.jpg

Fotografia com Francisco Lobo Vasconcelos (Arquitecto) Lurdes Rosa (Professora e Historiadora), Adelaide Cruz (Tecnica da C. M. V. Franca de Xira), Miguel Metelo Seixas (Professor e Historiador) após a inesquecível visita e recolha imagens na Quinta de Nossa Senhora da Piedade, na Póvoa de Santa Iria, até 1917 património da Casa de Abrantes. O "Morgado da Póvoa" é uma das profundas âncoras da família Lancastre na história de Portugal. É curioso como desde meados do século XVII os Lancastre tenham abraçado a devoção a Nossa Senhora da Piedade através do nome de baptismo, nomeadamente a partir do VI Conde de Vila Nova de Portimão, D. José Maria da Piedade (1742-71). Não falta muito tempo para a publicação desta obra profusamente ilustrada em que estou a dar os retoques finais. Darei notícias em breve sobre o assunto.

Uma ligação improvável

Palacio de Santos.jpg

Não deixa de ser no mínimo curiosa a ligação que se desenvolveu entre os franceses e a Casa de Abrantes durante o séc. XIX, deste logo com o palácio de Santos que hoje é uma das mais luxuosas embaixadas do Estado Francês no mundo inteiro. Deduz-se das memórias de Laure Permon que o Casal Junot terá frequentado o Palácio de Santos, quando o futuro General esteve em Lisboa entre 1805 e 1806 em “missão diplomática”. O V Marquês de Abrantes, terá sido por diversas vezes seu interlocutor, incumbido que fora pelo príncipe D. João da presidência do Conselho de Regência aquando da partida da Família Real para o Brasil. Difícil é acreditar que a atribuição do título de “Duque de Abrantès” ao seu General por Napoleão, certamente a pedido de Junot, não esteja ligada a uma sua predileção a esta Casa e ao prestígio que este título conferia à época em Portugal. Não havendo provas da ocupação do palácio pelos franceses durante as invasões, chegam-nos testemunhos orais da família que o seu recheio terá sido por várias vezes “inspecionado” pelos oficiais de Junot. Também o conde de Armand, embaixador de França em Lisboa, em 1870 se deixa seduzir pelo palácio que arrendou parcialmente para sua residência. A partir de então aí teve o Estado Francês sempre representação até à sua aquisição em 1909 ao meu bisavô. Não me digam que não há aqui um padrão. Ou apenas um mais que justificado “coup de foudre”. Chegado aos dias de hoje não poderia estar o Palácio dos Marqueses de Abrantes em melhores mãos. De facto, os sucessivos embaixadores têm sabido muito bem cuidar deste património sem o descaracterizar e tratado com grande gentileza os sucessores dos antigos proprietários.
 
Trecho do meu livro "A Casa de Abrantes, uma História de Resistência" em que tenho estado a trabalhar e me tem afastado da escrita no blog cuja publicação está para breve. 
 
Na imagem: César Biseo – Salão Grande do palácio de Santos – aguarela 1871 

O caso da coroa romena e o movimento monárquico em Portugal - Uma lição

Rei Miguel.jpg

O fenómeno de afirmação da coroa romena, pairando acima da república que nos anos 90, com várias nuances e progressivamente ocidentalizada, substituiu a tirânica ditadura comunista de Ceaușescu, deveria fazer-nos pensar. O carismático Rei Miguel (1921 — 2017), expulso da sua pátria em 1947 pelo governo pró-soviético teve um papel fundamental para que tal acontecesse. Autorizado a voltar à Roménia em 1992, só em 1997 recuperou a cidadania romena que lhe havia sido retirada pelos comunistas. O sucesso do seu regresso culmina em 2011 quando foi convidado a discursar na abertura do parlamento romeno instituído pela constituição republicana de 1991. Reduzindo progressivamente a intensa vida pública por causa da sua idade avançada, o Rei Miguel teve sempre o apoio da Princesa Margareta que com ele palmilhou o caminho de reafirmação institucional da Casa Real Romena. Hoje ela é reconhecida como elemento agregador da nação, fruto da incansável dedicação ao seu povo, expresso através da constante presença no meio da população e no apoio às comunidades. Nesse sentido, como reconhecimento inequívoco da sua relevância pelo Estado, foi devolvido à Família Real o Palácio Elisabeta, sua residência oficial em Bucareste. A administração da Coroa Romena radica numa associação reconhecida pelo Estado como de “utilidade pública”, sustentada pelo movimento monárquico, que reúne muitos voluntários e militantes dedicados ao apoio à Família Real na gestão do património que lhe foi outorgado e na organização das diversas vertentes da sua agenda. Esta organização, apesar de incluir vários políticos no activo, assume-se inteiramente avessa à política, totalmente “independente das modas e paixões políticas do tempo”. Foi sob esta estratégia que a Roménia recuperou a Coroa Real para o seu brasão de armas.

Salvaguardadas as devidas distâncias e contextos (nomeadamente o persistente jacobinismo nacional), esta história de sucesso remete-nos para a reflexão sobre as dificuldades com que o nosso movimento toda a vida se deparou, principalmente por causa das diferentes sensibilidades monárquicas que sempre se digladiaram, e com especial intensidade a partir do dia 6 de Outubro de 1910, quando a unidade se tornava um imperativo. Uma coisa parece-me certa: o sucesso da Causa Real (uma corrida de fundo em que temos de saber perseverar) depende fundamentalmente de dois factores. O primeiro é o da existência e cooperação de uma Casa Real inquestionável – privilégio de que usufruímos - e, em segundo lugar, conseguirmos fazer do nosso movimento uma casa comum e acolhedora de diferentes correntes de pensamento e sensibilidades, todas elas legítimas, sempre com total liberdade de debate, sem tentações de sobreposição ou de hegemonias. Sem isso, arriscamo-nos a ser vistos como um partido político com uma agenda ideológica, campo sobejamente ocupado e onde não traríamos nada de diferenciador, tornando-nos então irremediavelmente irrelevantes. 

Princess-Margareta.jpg

Princesa Margareta em 2017

Texto adaptado do editorial da revista Correio Real nº 24