Os pecados da Igreja e do Daniel Oliveira
Mesmo conhecendo o seu enviesamento ideológico, deixa-me muito incomodado e perplexo final do primeiro parágrafo do artigo do Daniel Oliveira, publicado no Expresso desta semana, com honras de pág. 3. Diz assim: "(...) Mas os católicos que se sentem chocados com estas revelações têm, antes de tudo, de pôr a mão na sua consciência. Nada disto é surpresa. Porque o permitiram durante tanto tempo? Porque tiveram os denunciantes, fossem vítimas, familiares ou outros padres, de lidar com a indiferença ou incompreensão das suas comunidades? Com tanto ativismo para reprimir o sexo consentido entre adultos livres e impedir que se fale de sexualidade na escola, porque não se mobilizaram mais católicos para protegerem as crianças do abuso na sua própria Igreja?" É impressão minha ou ele acusa-me a mim (como integrante em diferentes épocas da minha vida em diferentes comunidades católicas) de cumplicidade pelo silêncio nos casos? Ora, nos anos mais recentes, o confronto com estas notícias tem sido para mim um profundo choque. Precisamente porque na experiência de vida que levo na Igreja - a ralação com padres, catequistas, movimentos, paroquianos - nada alguma vez me fez suspeitar que tais anormalidades pudessem acontecer. A minha estranheza só se compara com a revolta e tristeza que sinto com esses comportamentos que evidentemente não são padrão na igreja, que é a mensagem que o autor quer fazer passar. Como é que eu, e milhões de católicos como eu, podem ser acusados de cumplicidade? Ou porque Daniel Oliveira não conhece minimamente a dinâmica inorgânica da igreja ou por profunda má-fé. De resto, não servindo de todo de consolação, fiquemos com a frase final da crónica do Henrique Raposo na mesma edição do jornal: "quando nos revoltamos contra os pecados da Igreja, estamos na verdade a olhar para o nosso rosto reflectido num espelho".