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João Távora

Lucros excessivos, cartazes no marquês e a nossa triste sina

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Talvez por coincidência, enquanto o António Costa e o PS, ao estilo mais populista e demagógico, aliados com a extrema-esquerda tomam de assalto os destinos de Portugal acabado de sair de um doloroso resgate financeiro, quando desesperançados pensávamos que tínhamos batido no fundo, o pior estava para vir: emerge André Ventura, com um discurso revolucionário e demagógico, ao pior estilo do PCP e do Bloco de Esquerda, a fracturar uma direita já de si exaurida. Não é preciso recordar o descaminho que acelerou desde então, mas que se reflecte bem no desaparecimento do CDS e na conquista da maioria absoluta pelos socialistas a que estamos condenados para a eternidade, como que um castigo divino. O PS ocupou o centro político, ocupou o regime e o Estado com que se confunde, enquanto o país empobrece continuamente atolado num destino medíocre, com um macaquinho de realejo como Chefe de Estado.

Aqui chegados temos o partido Chega a misturar o discurso anticapitalista e assistencialista da esquerda radical com o nacionalismo populista "anti-política", reclamando a continuação de apoios governamentais de 125,00 (e a vigilância do povo para que não o gaste em álcool e drogas) e a taxação dos “lucros excessivos” dos privados oportunistas, que têm de ser vigiados de perto pela Autoridade Tributária, de modos a que continuemos garantidamente e igualitariamente todos muito pobres e dependentes de subsídios – os tempos de carência que aí vêm convidam à narrativa. O mesmo André Ventura que se junta aos comunistas a afrontar a gestão da Câmara Municipal de Lisboa – um oásis da direita civilizada em Portugal - exigindo os cartazes de propaganda política de volta à Praça Marquês de Pombal - monumento que a bem dizer não faz falta nenhuma. Enquanto isso a Iniciativa Liberal afunda-se numa guerra interna, o PSD faz pela vida no seu canto do hemiciclo a encaixar as ordinarices do Primeiro-Ministro. E ninguém se lembra de exigir uma taxa pelos lucros excessivos da Autoridade Tributária. Perante este trágico panorama em que é que havemos nós de gastar os 125,00 €?

Fotografia CML -  Curiosa imagem da Praça Marquês de Pombal nos anos 70. Facilitava-se nos cartazes, no estacionamento e na venda ambulante de atoalhados. 

Uma meditação sobre a Igreja e a Fé Católica em Portugal

A crise na Igreja - ainda vai piorar antes de melhorar

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É grande a aflição que sinto a propósito da progressiva e acelerada perda de influência da Igreja Católica no espaço público do Ocidente, particularmente em Portugal que é o meu País. Julgo aliás que a terrível crise que actualmente abala a Igreja portuguesa e envergonha os cristãos, pouco tem que ver com a decadência a que me refiro – a Igreja sempre juntou pecadores, uns heróis outros traidores, e nem Jesus Cristo no seu tempo, com doze apóstolos, escapou a essa fatalidade.  Quando a nossa alma sangra de dor perante a insistente exposição pública, ao vivo e a cores, dos mais obscuros pecados de uns quantos elementos da Igreja, não podemos ceder a tomar a nuvem por Juno, menosprezando o papel dos seus santos e heróis anónimos, no consolo e socorro de gerações, na evangelização de milhões de almas desamparadas na expectativa dum sentido superior para a sua história. Se os outros não querem saber dessa história luminosa, nós os católicos temos por dever de procurar consolo nela. Só com profunda desonestidade intelectual ou má-fé poderemos ignorar os verdadeiros imitadores de Cristo nossos antepassados que ao longo de dois mil anos nos transmitiram a importância redentora desta pertença. Por ironia do destino, o Ocidente “liberal e próspero”, que eu não trocava por nenhuma outra cultura e que ameaça degenerar para uma fórmula autodestrutiva de extremo-individualismo, é obra da revolucionária mensagem de Cristo: o livre arbítrio, a sacralidade da pessoa humana única e irrepetível, e a caridade (ou Amor e o Perdão que são sinónimos).

Ainda nos iremos arrepender de, em pouco mais de 200 anos, termos metódica e progressivamente desbaratado uma Igreja que se confunde com as nossas raízes históricas, e que hoje constitui em Portugal um dos últimos redutos que, com a sua rede capilar territorial, ainda faz frente ao estatismo, o Estado todo-poderoso que engoliu praticamente tudo e toda a gente na sua dependência e controlo. Com todos os seus erros defeitos, a Igreja é a última resistência ao Leviatã. Amantes da liberdade, cuidado com aquilo que desejais.

Como é que este Ocidente “bem-sucedido” prescinde do legado da Fé cristã? Hoje a mensagem não passa à refeição em família, muito menos no TikTok ou no Instagram. A questão fundamental que me aflige, é a de se é possível recolocar a Fé cristã no centro da existência de pessoas “satisfeitas”. Porque sendo testemunhos uns para os outros é mais fácil a conversão em comunidades. É mais fácil resistir. Não preciso olhar mais longe do que para a minha família, nuclear ou alargada, para perceber como hoje em dia a conversão é tarefa duma exigência quase sobre-humana, porque os milagres não acontecem todos os dias.

Como referia Rui Ramos recentemente num dos programas “E o resto é história” da Rádio Observador que semanalmente realiza com João Miguel Tavares a propósito daquilo que seria o “Serviço Nacional de Saúde” antes do prodigioso século XX, antigamente as pessoas, mais que ter um médico ou um hospital (onde os tratamentos eram pouco menos que rústicas e inúteis mezinhas) preocupavam-se com a salvação da alma: a prioridade era a construção duma Igreja, uma capela ou um oratório para suplicar ou dar graças. Os hospitais existiam para acolher os mais desprotegidos e assisti-los no padecimento da doença e da miséria física (a saúde era uma função importante do Estado – como refere Rui Ramos no citado programa, o Hospital de Todos os Santos em 1750 tinha 750 doentes internados e todos os concelhos do país dispunham de “Médicos de partido” municipais para “ministrar socorro clínico aos indigentes”). Mas sendo a morte e da dor tão implacavelmente presente no dia-a-dia, o mais importante era garantir a salvação da alma, a reconciliação com o divino – o perdão, o consolo. Hoje escondemos a morte, mas no século XVIII isso não era possível. É fácil verificá-lo pelos arquivos das paróquias ou de famílias a frequência com que as senhoras (de qualquer condição) morriam a dar à luz, e a impressionante mortalidade infantil, quando era comum numa família de cinco filhos chegarem apenas um ou dois à idade adulta. A esperança média de vida em Portugal, em 1920 – já no século XX - seria de apenas 35,6 anos. A vida das pessoas era uma roleta russa. Tudo isto, a par com uma existência quotidiana mais austera no que refere a distracções, convidava certamente as pessoas a uma procura espiritual e vida religiosa, que as juntasse através das celebrações e rituais, e no fim as reconfortasse através de um sentido superior da existência. Tempos de trevas que impeliam as pessoas a procurar uma luz.

Hoje os tempos são diferentes, melhores evidentemente: a par do progresso da medicina e da ciência, a vida é relativamente previsível e a dor física quase sempre evitável para toda a gente. Ao mesmo tempo o milagre económico no hemisfério norte democratizou o consumo. Está à mão de semear de todos nós, mesmo para aqueles sem grandes recursos, uma infindável panóplia de opções de entretenimento e de satisfações sensoriais. Os sentimentos, como a tristeza, a angústia, ou ansiedades resolvem-se com comprimidos ou num Centro Comercial.

Deste modo com a água do banho deitou-se pela janela também o bebé. A vida espiritual, como a poesia ou a literatura, em vez de se democratizarem como a gastronomia ou higiene do corpo tornaram-se supérfluas inconveniências. As Igrejas estão cada vez mais vazias porque o drama humano se transformou matéria de erudição, capricho duma minoria inquieta e inconformada com o tamanho duma vida que afinal cabe num algoritmo, que não é nada comparado com um grão de estrela do outro lado da galáxia.

Como aqueles que me conhecem sabem bem, sou católico praticante, porque essa procura constitui um alicerce existencial muito importante para a minha liberdade e inteireza como individuo, coisa que nem sempre me aconteceu na vida. Não sou cristão por patriotismo ou militância, sou dos de Cristo por opção, e a minha Fé uma graça que persigo com persistência. E porque esta pertença me salva tantas vezes a cada dia, gostava que os outros ao meu lado ou depois de mim, a conhecessem, a experimentassem. Voltará a acontecer no futuro certamente através duma Igreja diferente da que hoje ameaça sucumbir à perversidade humana, de dentro e de fora dela. Minoritária, será certamente mais sábia, mais resistente, santa e ciente do legado que guarda desde São Pedro.

Entretanto, preparemo-nos para o pior – a malta ainda irá dançar, beber e fumar dentro das nossas igrejas.

Publiicado também aqui no Observador

Jornadas

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Há já por aí muita gente indignada, por ignorância ou má-fé, com o preço 235,00 de inscrição nas JMJ que decorrem em Lisboa início do mês de Agosto próximo. Os títulos sensacionalistas dos jornais como este do Correio da Manhã convidam ao disparate. Agora que o país prepara-se para se fracturar em dois, com argumentos contra e os a favor desta iniciativa, convém esclarecer que o "pacote" disponibilizado pela organização inclui alimentação, alojamento, transporte, seguro e um kit de participante que dá acesso a toda a programação entre os dias 1 e 6 de Agosto de 2023. Quem quiser ir por sua conta não paga nada. E como é habitual nas actividades dos movimentos da Igreja Católica, uma inscrição paga sempre várias outras daqueles que não têm dinheiro. Ninguém é deixado para trás.