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João Távora

As meninas a jogar à bola

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Já tinha reparado na intensa campanha publicitária da Federação e dos patrocinadores a promover a equipa portuguesa feminina de futebol, que pela primeira vez participa num Campeonato do Mundo, desta feita a decorrer por estes dias na Austrália e na Nova Zelândia. A campanha até me pareceu positiva, as jogadoras são giras, e principalmente agradou-me que se designassem a si próprias como meninas, que o “género” não é coisa tão líquida quanto se pretende afirmar. Tem piada aquela imagem do festejo da jogadora com a bola metida dentro da camisola a imitar o gesto dos homens no estádio a dedicar o golo à sua companheira pressupostamente grávida… de uma “menina”.

Calhou-me esta manhã ver os últimos vinte minutos do jogo entre as selecções do Vietname e de Portugal. Ora, como eu já calculava, com base nas experiências anteriores nos campeonatos domésticos (onde que o futebol feminino do Sporting dá cartas), o espectáculo futebolístico em si, despido de qualquer lente paternalista ou condescendência, é confrangedor, tecnicamente muito pobre. Descontando o problema da lentidão, (o tempo que demora uma (rara) jogada que vá de um lado ao outro do campo) a questão está na técnica das atletas. Os falhanços são muitos e por vezes infantis. Foi aflitivo o número de golos feitos com origem em jogadas atabalhoadas que não foram concretizados pela selecção portuguesa por pura aselhice. Diga-se que as nossas meninas encostaram literalmente a selecção vietnamita às cordas, num jogo de um só sentido.

Ouvi dizer que se reclama por aí a igualdade de remuneração dos direitos televisivos e consequentemente às jogadoras profissionais, minimamente parecido com o capital investido no futebol masculino. Ora isso parece-me impossível enquanto a modalidade não atrair o correspondente número de adeptos e não gerar um número considerável de atletas fora de série que tornem o jogo emocionante e atractivo. Como apreciador pagante de futebol, acredito que a modalidade feminina possa evoluir ainda bastante, mas não sei se a equiparação será algum dia possível, dadas as características físicas das meninas. Talvez se forem reduzidos o tempo e o tamanho do recinto de jogo se proporcione mais rapidez ao futebol feminino, mas duvido que algum dia ele possa ombrear com o masculino em termos de espectacularidade.

Que ainda há muito que fazer quanto ao direito das mulheres à absoluta igualdade de direitos e dignidade não existem quaisquer dúvidas. Mas que seja no respeito pelas suas diferenças intrínsecas, como aquelas que obrigam uma equipa hospitalar numa mesa de operações saber se o paciente é do sexo masculino ou feminino, para não o matar com a dose errada de anestesia ou de outro fármaco. De resto não percebo este fanatismo pela “igualdade” a todo o custo entre homens e mulheres. Aprecio muito a diferença entre nós. E sou levado a concordar com o Henrique Pereira dos Santos quando há dias afirmava que a “igualdade não é as jogadoras de futebol ganharem o mesmo que os jogadores de futebol, igualdade é não haver campeonatos femininos e masculinos e jogarem todos no mesmo campeonato.” Desde que a essas jogadoras não comece a crescer barba, digo eu.

A conversão à Liberdade

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Eu percebo que tenhamos uma Igreja habituada a viver entrincheirada, receosa de propor caminhos, justificada pelos seus inimigos internos e externos. No Ocidente, têm sido décadas de encolhimento perante um poder arrebatador do Grande Leviatan que tudo vem secando à volta, até a fecundidade das suas gentes. Repare-se que nas últimas décadas todas as guerras do catolicismo vêm sendo perdidas: dessacralizou-se o casamento que passou a ser tudo e o seu contrário perante a lei. Assim se enfraqueceu a Família natural construtora do bem-sucedido Ocidente e que era terreno fértil para a evangelização, para a passagem dos valores cristãos. Com o advento do hiperindividualismo, em paralelo com o consequente Inverno Demográfico, legitimou-se o aborto e a morte assistida. A religião foi remetida ao foro privado para não ferir susceptibilidades, o ditame da moralidade, do bem e do mal, também – tudo é relativo, a Verdade, que é o que o cristianismo tem a propor, esconde-se envergonhada.

É este também o retrato da Igreja portuguesa, acossada e amedrontada, que, durante uma semana, neste canto da Europa laica e materialista, se atreverá a ser o foco de todas as atenções. Coube-lhe liderar esta gigantesca operação logística de receber centenas de milhares de Jovens de todo o mundo, a oferecerem-se à conversão. Cabe-lhe, por consequência, difundir uma forte mensagem, não só para todos os milhares de resistentes peregrinos que ainda procuram um sentido de vida maior que o seu umbigo, mas para todos aqueles hesitantes que não se atrevem a passar do Páteo dos Gentios.

Há dias, a propósito de tudo isto e dessa oportunidade de conversão que a Jornada Mundial da Juventude proporciona, num almoço entre amigos, um deles, perguntava qual a mais importante mensagem de Jesus que verdadeiramente interessará aos jovens nestes tempos de acelerada descristianização e niilismo. Como pode a Igreja Católica afirmar-se na ruidosa cidade da abundância do século XXI?

Entre várias propostas lançadas na mesa pelos convivas, da mensagem de Vida Eterna, à revolucionária revelação da Misericórdia (Amai-vos uns aos outros…) eu defendi a da Liberdade. Receio que numa sociedade onde impera o bem-estar e se reclama o prazer como um direito, o anúncio da Vida Eterna não tenha grande sucesso. Já o Novo Mandamento do “Amai-vos como irmãos”, que chegou a ser um traço reconhecido nas primeiras comunidades cristãs (“vede como eles se amam!”), temo que tenha sido banalizado pela confusão gerada à volta do conceito de Amor, hoje tido como algo ligado ao prazer erótico e psicológico, assim difundido pela minha geração nos anos sessenta. Um dia as comunidades recuperarão o seu verdadeiro sentido, o da Compaixão – mas não vai ser no meu tempo.

Ora, quanto a mim, a principal mensagem que o Cristianismo tem para oferecer, que obviamente se interliga com as anteriores, é a da Liberdade, mas com maiúscula. Porque julgo que, num tempo como o actual, com tantas formas de alienação a escravizar as almas crédulas, apoucando-lhes as existências, a Liberdade, no sentido de consciência livre e responsável, é a grande outorga de Jesus Cristo que convém salientar. Se, como afirma Bob Dylan estamos condenados a ser servos (Gotta Serve Somebody - Slow Train Coming, 1979), que sirvamos o Senhor Jesus que nos desimpede os caminhos e principalmente a alma.

Para alcançar essa alforria não é necessário seguir-se à risca o exemplo de São Francisco de Borja, Duque de Gandia, que, perante a profunda dor e desapontamento com a morte da bonita e instruída Rainha Isabel de Portugal (filha de D. Manuel I e mulher de Carlos V de Espanha), que tanto admirava, afirmou: “não mais servirei senhor que pereça”. A partir de então devotou a sua vida por inteiro aos assuntos do seu Deus.

Com Jesus Cristo aprendemos onde colocamos o coração a criar valor, a reconhecer as paixões que nos podem escravizar e diminuir, ou a única que que faz de nós verdadeiros e autónomos filhos de Deus. Que a cada um conhece como único, “Até os cabelos da vossa cabeça estão todos contados. Portanto, não temais: valeis muito mais do que todos os passarinhos” (Lucas 12:7). Ou ainda, “Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de Mim, que sou manso e humilde de coração, e encontrareis descanso para as vossas almas. (Mateus 11:29-30).”

É esta descoberta de Liberdade como caminho que me convenço ser a mais importante mensagem a outorgar aos jovens do nosso tempo. A Liberdade de quem, participando no Mundo, não o carrega às costas, nem às suas normas e atracções se deixa subjugar. De beleza, de carreira, de haveres, de amores, de ansiedades, de orgulhos, dos medos, da expectativa dos outros, enfim, de dependências grandes e mesquinhas. É esta Liberdade que está ao alcance de todos e que urge transmitir aos nossos jovens. Irão certamente gostar de saber que o seu Senhor (no sentido medieval do termo) não é deste Mundo, e que isso lhes permite olhar as coisas do Mundo com outros olhos – fazer escolhas de felicidade. Serem protagonistas das suas próprias vidas.

É esse o feito da conversão, construída em comunidade de crentes. Com muita oração – a barulheira mundana dificulta a prática da Oração que com o seu poder a todos eleva, dignifica, aproximando-nos de Deus. É assim que adquirimos um sentido proporcional da importância das coisas do Mundo. Que nos conduz à Liberdade de nele agir. Não de caminhar sobre as águas, nem de voar pelos céus, mas percorrer esta vida de pés bem assentes no chão, com a cabeça erguida e o coração… consolado.

Que a JMJ inspire muitas conversões apaixonadas pela pertença à Igreja de Cristo, são os meus votos.

Publicado originalmente no Observador

Os católicos e as redes sociais

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A propósito da nomeação de Américo Aguiar a Cardeal e duma frase infeliz por si proferida numa entrevista recente faz-me muita impressão a quantidade de cristãos que nas redes sociais se sentem legitimados a fazer julgamentos sumários e tomar partido em assuntos delicados e complexos da (sua?) Igreja, com uma arrogância de pasmar.  

Foi por isso que me lembrei do meu pai que foi de tal modo contra o Concílio Vaticano II que só perto do fim da vida voltou a ir à Missa. Mas curiosamente, à parte dum ou outro reprimido sussurro à frouxidão dum ou doutro Bispo (a história repete-se…), nunca o ouvi nem dele li qualquer opinião sobre o assunto, que guardava só para si por respeito à Santa Madre Igreja. E talvez, suponho eu, para não armadilhar o crescimento dos filhos nessa pertença que nunca renegou.

Mas o curioso é que hoje qualquer bicho caruncho, cheio de certezas, tem uma opinião histriónica sobre as opções da Hierarquia e do Vaticano, que da sua trincheira desfralda aos 4 ventos nas redes sociais, cada vez mais uma tasca mal frequentada.

Viva a liberdade de opinião mas cuidado não tropecem nela.