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João Távora

Golpadas e revoluções

 

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Evidentemente saúdo a democracia recuperada há 50 anos no 25 de Abril - quase desbaratada de seguida. Afinal, foi ao tempo da monarquia liberal, ao longo do século XIX, que se ensaiaram os primeiros e acidentados passos duma democracia moderna, um processo interrompido com o regicídio e a 1ª república.

Para celebrar o nosso regime liberal representativo não são necessários exercícios infantis de diabolização do passado. Acontece que não nos aliviam a consciência das misérias e preocupações do presente, uma delas com a Liberdade.

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Golpe de Estado é a fórmula típica portuguesa de fazer as reformas que os apaniguados do regime protelam e empurram com a barriga. É assim há mais de 200 anos a "começar de novo" e não tem dado bom resultado. Uma sondagem há dias dizia que o 25 de Abril é o momento histórico mais importante da história de Portugal.

Aguardemos pelo próximo.

Ribeiro Telles, um monárquico arquitecto da democracia

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Escapará por certo a muita gente que Gonçalo Ribeiro Telles, entre os anos cinquenta e setenta do século XX, assumiu um importante papel na transição do regime, que culminou com a sua eleição como deputado da AD e designação para Ministro da Qualidade de Vida do governo de Francisco Sá Carneiro. Tal percurso aconteceu, resumidamente, com a criação em 1957 do Movimento dos Monárquicos Independentes, a que se seguiria o Movimento dos Monárquicos Populares, com a posterior integração em 1969 na Comissão Eleitoral Monárquica, para concorrer à Assembleia Nacional. Hoje mais conhecido como fundador do movimento ecologista em Portugal, Ribeiro Telles sempre foi para mim um exemplo da moderação e da abrangência política particularmente relevante num líder monárquico. Como já referi por diversas vezes, a chefia de Estado Real, o rei, só o será algum dia enquanto máximo zelador da liberdade de todos, todos, todos. Uma monarquia, na complexidade das sociedades actuais, só poderá perdurar assente em largos e profundos consensos duma nação antiga como a nossa, que legitimem a prevalência dessa tradição.

Independentemente do falhanço do equívoco projeto partidário do PPM, que Ribeiro Telles fundou com algumas das mais excepcionais personalidades políticas de então, como Henrique Barrilaro Ruas, Francisco Rolão Preto e Augusto Ferreira do Amaral, a sua liderança e autoridade — que extravasou o âmbito dos monárquicos — sempre me mereceu profundo respeito. Não partilhando muitas das suas referências ideológicas, admiro-o como o comunicador cativante e inato que foi, como católico praticante, e pela manifesta lealdade à Causa Real e à Casa de Bragança, na pessoa do Senhor Dom Duarte, que perdurou até ao fim da sua longa vida. Até poucos anos antes da sua morte em 2020, fez questão em participar na vida da Real Associação de Lisboa, de que era membro, e com ele tive o privilégio de me cruzar em Assembleias Gerais e de o entrevistar para a revista que publicamos.

É porque esse seu protagonismo na política portuguesa tende a ser esquecido e menosprezado pela tirania politicamente correcta, que a Real Associação de Lisboa, no âmbito das celebrações do 50.º aniversário do 25 de Abril, decidiu reeditar uma sua antologia intitulada Porque Sou Monárquico, com base na recolha preparada por Vasco Rosa (que também organizou para a Real Associação de Lisboa a antologia A Liberdade Portuguesa, de Henrique Barrilaro Ruas, também ele deputado constituinte de boa memória para muitos), cujo lançamento se realizará — simbolicamente — no próximo dia 23, terça-feira, pelas 18:30, no Auditório Almeida Santos do Parlamento português, ou palácio de São Bento. A nova edição, com um texto inédito, estará disponível para venda no local e também aqui.

Com mais esta homenagem ao saudoso arquitecto paisagista, ecologista e político, pretende-se realçar o papel dos monárquicos na transição do Estado Novo para a Democracia. Aqui deixo o desafio aos leitores a participar neste importante evento, que contará com a honrosa presença dos Duques de Bragança e com a participação especial de Augusto Ferreira do Amaral, co-fundador do PPM, João Barroso Soares, que com o homenageado conviveu durante os seus mandatos na CML, e do historiador José Miguel Sardica, profundo conhecedor da história do século XX, área de investigação em que há muito se vem afirmando. A conferência promete.

A democracia e a liberdade são o território natural dos monárquicos portugueses. Importa não esquecê-lo — ou, como agora se diz, cancelá-lo.

Texto original publicado no Observador

E pur si muove!

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Da leitura que faço da história de Portugal na primeira metade do Séc. XX, fico com a ideia clara de que Salazar se limitou a governar ao “centro” que é para onde empurram sempre os ventos da História. Tenho o entendimento de que o chamado “centro” em política é simplesmente o pensamento dominante em determinada época. Ou seja, a luta política pelos seus actores e lideranças sectárias, não é mais do que a promoção de um determinado modelo de ideias no espaço do centro, que é definido pela maioria politica-sociológica em que os regimes se suportam numa determinada época. Quero eu dizer, simplificando muito, que o Estado Novo correspondeu durante mais de duas décadas às expectativas da grande maioria população portuguesa. O Estado Novo não promoveu o catolicismo, limitou-se a surfar a religiosidade da grande maioria dos portugueses, não era mais puritano que a grande maioria desses portugueses. Em grande medida, sem uma repressão exagerada como aconteceu a leste da Europa, o Estado Novo foi simplesmente o espelho das expectativas dos portugueses que, depois dos tempos revolucionários da 1ª República, o acolheram e aclamaram com vista à sua felicidade. Não foi só a prosperidade económica e a esperança numa vida melhor (o ponto de partida era muito baixo) que determinou a aquiescência popular àquele regime autoritário. No fundo, no fundo, Estado Novo foi, ao seu tempo e no seu auge, “politicamente correcto”.

A experiência que a rua me concede coincide com este perfil dos portugueses. A sua grande maioria é muito pouco ideológica e menos ainda sectária. Acredito pouco no sucesso das movimentações partidárias que pretendem mudar à força (ortopedicamente) esse “centro” político dos portugueses. Quero eu dizer que os “Educadores do Povo”, sejam eles partidos políticos, ou a Comunicação Social, têm genericamente pouco sucesso nas suas intenções. Foi isso que intui, por exemplo nos tempos da Covid, e que tentei explicar um dia destes num almoço de amigos “reacionários”, digamos assim, sem sucesso. Vencia naquela mesa a tese de que a epidemia de Covid teria sido uma conspiração dos governos ocidentais para maquiavelicamente subjugar, talvez através de vacinas de cariz duvidoso, o povo ignaro. Talvez motivados pelos interesses obscuros dos grandes laboratórios. Contra isso, argumentava eu que, independentemente da avaliação do verdadeiro grau severidade da crise sanitária, os governos e as medidas por si implementadas se limitaram a corresponder às expectativas das populações dentro dos seus condicionamentos económicos e culturais. Veja-se o que aconteceu a Boris Johnson, cuja displicência inicial e os escândalos finais o liquidaram politicamente. As medidas implementadas pelos governos, mais ou menos repressivas ou persecutórias, liberais ou antiliberais, incluindo as campanhas de vacinação, foram aquelas que foram abraçadas, desejadas e exigidas pelo grande “centrão” político de cada país, sem grande critério científico ou outro. De resto, quanto aos resultados das diferentes estratégias, bem sabemos como as estatísticas bem torturadas, darão aquilo que cada um pretenda.

Serve isto para dizer que acho que não vale a pena batalhar-se pelas ideias que cada um defende, tentar influenciar o centrão politicamente correcto que nos oprime a cada época? Sendo certo que é ingénuo querer-se mudar a direcção do vento com as mãos, a história prova-nos à saciedade que mudam-se os tempos e mudam-se as vontades. Como tento explicar pelo exemplo dado no primeiro parágrafo, os ventos mudam, afrontando a irrelevância da vontade de cada um. Nem sempre para melhor, entenda-se, o “centro” move-se. Desde que pareça moderno a cada geração.

Prognósticos só depois do jogo

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Amanhã à noite Alvalade estará em euforia para aquele que julgo ser o mais importante dérbi dos últimos anos. À tradicional rivalidade entre os dois clubes vizinhos, junta-se a luta pelo título de campeão, cujas oportunidades de disputa se encontra cada vez mais limitada: a seis jornadas do fim, Sporting e Benfica, nesta ordem, ocupam os dois primeiros lugares do campeonato com a diferença de um ponto, destacados do terceiro. Este jogo acontece quatro dias depois de um outro dérbi, esse para a Taça de Portugal, em que o Benfica, apesar de ter feito a melhor exibição da época, com um empate a duas bolas se viu arredado da final da Taça de Portugal, a disputar no Jamor no final de Maio - lá estarei, se Deus quiser. Nesse jogo, o clube de Carnide, confirmou a tradição que reclamam os especialistas, de que a equipa em pior forma nestes embates, normalmente se supera. Foi o que aconteceu há dias, apesar disso não ter chegado para levar de vencida a equipa leonina na eliminatória.

Aqui chegados, o que interessa verdadeiramente é o confronto que se repetirá amanhã à noite num estádio de Alvalade lotado, onde o verde e branco será imperial e as emoções estarão ao rubro.

Confesso-vos que tenho más memórias de dérbis decisivos em Alvalade, tenho ideia que normalmente não correm bem aos leões. Assim de repente, lembro-me de dois exemplos que testemunhei ao vivo: na época 1999/2000, quando na penúltima jornada o Sporting se podia sagrar campeão, perto do final do jogo o Benfica, por intermédio de Sabry, marcou um golo, que enregelou o antigo estádio de Alvalade, já encharcado por horas seguidas de uma chuva persistente. A festa foi adiada uma semana: a equipa de Augusto Inácio sagrou-se campeã na jornada seguinte e os festejos há dezoito anos esperados foram absolutamente memoráveis. Mais desagradável foi uns anos depois, quando a equipa leonina, dirigida por José Peseiro em 2004/2005, também na penúltima jornada, perde por um maldito golo de Luisão (sempre me pareceu em falta sobre o guarda-redes Ricardo na pequena área) a sete minutos do fim, derrota que custou o título aos leões.

O que é um facto por estes dias é que o Sporting é quem de longe está a jogar o melhor futebol em Portugal, ao fim de 28 jornadas conta como vitórias todos os desafios jogados em Alvalade, que tem à frente do ataque um Panzer chamado Gyökeres, e que, na verdade, last but not least, afinal este jogo não será assim tão decisivo. Acontece que depois do apito final estarão ainda 18 pontos em disputa para o Sporting que tem um jogo em atraso, sem contar com o melhor treinador do campeonato, um senhor, chamado Rúben Amorim. Razões suficientes para amanhã ocupar o meu lugar no estádio com alguma confiança. De resto, sportinguistas e benfiquistas, eternos rivais, sabem bem da imprevisibilidade de um dérbi. Prognósticos só depois do jogo.

Haja coração!!!

Publicado originalmente aqui