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João Távora

Nunca interrompa o seu inimigo enquanto ele estiver a cometer um erro

A propósito do rasgar de vestes e vozearia indignada por conta da rusga da passada quinta-feira no Martim Moniz, por parte de comentadores e políticos particularmente virtuosos - como o autarca Miguel Coelho, Ferro Rodrigues ou Pedro Nuno Santos -, a acusar Montenegro e Carlos Moedas da mais perversa iniquidade e outros defeitos de carácter piores, venho lembrar os meus amigos aquela velha máxima atribuída a Napoleão: “Nunca interrompa o seu inimigo enquanto ele estiver a cometer um erro”.

Os residentes e vizinhos das imediações da Rua do Benformoso, cansados do degradante espectáculo diário de marginalidade, estão por certo agradecidos e anseiam por mais.

Preparados para um milagre?

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Curiosa é a passagem do Evangelho (Lc 24) quando dois discípulos, após a crucificação, seguiam desolados para Emaús, e Jesus, sem que eles O reconhecessem se acercou indagando sobre o que conversavam. Estranhamente cegos, retorquiram-Lhe: «Serás Tu o único forasteiro em Jerusalém a não saber o que lá aconteceu nestes dias?» Contaram-Lhe então eles o que houvera acontecido três dias antes em Jerusalém, como estavam desiludidos com o desenrolar dos acontecimentos: “Nós esperávamos que fosse Ele quem estava prestes a resgatar Israel, mas, com tudo isto, já lá vai o terceiro dia desde que estas coisas aconteceram”. O facto é que só no fim do estranho encontro, acabam depois da ceia partilhada, por reconhecer um ao outro: «Não nos ardia o nosso coração quando Ele no caminho nos falava, quando nos abria as Escrituras?». Quando se reuniram com os restantes apóstolos logo relataram o espantoso encontro com o Salvador.

Vem isto a propósito do Natal que se aproxima, e que nos desafia a sairmos do “capacete”. Mais que as ingratas e inevitáveis rotinas mundanas, são as nossas limitações humanas que se impõe na percepção do Mundo, reduzindo-o à nossa (de cada um) precária inteligência. A história do Natal, do filho de Deus omnipotente que escolhe uma manjedoura para vir ao mundo é um alerta para a armadilha fatal do cinismo, que resulta dessa visão míope, para mais limitada a um minúsculo ponto de vista, da realidade.

Daí que nos seja tão difícil detectar os milagres que acontecem na nossa vida, dispormo-nos a uma perspetiva que se eleve das contingências e subjectivas sensações de cada momento. Foi essa disposição que os peregrinos de Emaús encontraram, e dessa forma lhes permitiu ser testemunhas do milagre anunciado pelas escrituras. A chegada do Messias para nos salvar, sofrendo e tomando a forma humana, para alcançar a Glória para nós, sua criação.

Paz na terra aos homens de Boa Vontade, que não deixem escapar o milagre do Natal que se aproxima. A alternativa não faz qualquer sentido.

Imagem: Caravaggio, 1601 - Óleo sobre tela, Galeria Nacional de Londres

Surpreendente testemunho

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Ontem, fora de horas, tendo apanhado um Uber conduzido por um jovem negro, reparei no facto curioso de o mostrador do rádio exibir uma emissora de Luanda. Porque a viagem era longa, para fazer um pouco de conversa, perguntei-lhe se era natural da capital de Angola, ao que o motorista me respondeu que não, que era oriundo de Cabinda. Então, veio à liça a sua preocupação com o abandono do governo angolano deste riquíssimo enclave e da permanência do latente conflito do seu povo que sente merecer outra atenção, talvez o reconhecimento de alguma autonomia administrativa face a Luanda. Com um discurso estruturado e muito razoável face a este sensível imbróglio, foi com alguma surpresa da minha parte que o ouvi traçar rasgados elogios ao Duque de Bragança, que o jovem angolano considerou como um dos protagonistas com uma posição mais equilibrada e independente sobre o assunto.

De facto, há décadas que, longe dos holofotes e sem reclamar estrelato, o Senhor Dom Duarte percorre os territórios e comunidades da antiga portugalidade, onde é acarinhado e muito respeitado, a construir pontes e semear laços de paz.

Foi um surpreendente e consolador testemunho, este que ontem me foi dado viver. 

Não há mal que sempre dure...

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Ninguém imaginaria há duas semanas a hecatombe que se iria abater na equipa de futebol do Sporting. Sou o primeiro a dar a mão à palmatória por tender a subestimar a importância do treinador no grupo de trabalho. Nem nas minhas mais negras previsões imaginaria que uma equipa aparentemente invencível com Ruben Amorim, duas semanas após a sua saída sofreria quatro derrotas seguidas. Os jogadores são os mesmos assim como o sistema de jogo – não me venham cá os intelectuais da bola com teorias de equívocas “novas geometrias” e “losangos do meio-campo” implementadas pelo novo treinador João Pereira: o sistema é o mesmo, condicionado por inúmeras lesões de jogadores fundamentais substituídos por diferentes protagonistas. O problema, quanto a mim não reside no novo treinador. Ruben Amorim nos últimos 4 anos envolveu-se e deixou uma marca fortíssima em todo o balneário do Sporting, uma mística que ao desaparecer, abalou profundamente o subconsciente dos jogadores, que ficaram com as pernas a tremer.  Isto para dizer que a quebra de produção da equipa tem mais a ver com a traumática saída de Amorim que com a entrada de João Pereira.  Qualquer treinador que chegasse depois de Amorim estaria condicionado por este impacto, estava condenado a ser queimado.

Como sempre defendi, o fascínio do futebol é a sua dinâmica colectiva, profundamente ligada a frágeis factores de psicologia de grupo lentos de implementar. Essa é a razão porque falham tantas equipas recheadas de bons jogadores. João Pereira pouco poderá fazer que resolva este problema de um dia para o outro, e estou em crer que a sua capacidade de liderança está definitivamente comprometida pela cruel realidade: quatro derrotas seguidas.

Tudo isto conduz a outra questão, para mim a mais efectiva neste momento. A preponderância de alguma racionalidade na massa adepta leonina, tão dada a atitudes autofágicas, como já se vislumbrou ontem com o arremesso de tochas aos jogadores na Bélgica por energúmenos das claques. Desses já sabemos o que esperar. Dos outros exige-se ponderação, amor ao clube e apoio incondicional à equipa que subir ao relvado no próximo sábado.

De resto, não há bem que sempre dure nem mal que nunca acabe. Por isso é que em mais de um século o Sporting nunca tinha ganho mais de 12 jogos e o record caiu. Os records são isso mesmo fenómenos raros, como quatro derrotas seguidas.

No que depende de nós sportinguistas, há que não deitar tudo a perder. E confiar em Frederico Varandas e Hugo Viana.

Publicado originalmente aqui