As melhores férias da minha vida II
Uma certa manhã de Agosto, no dia dos meus anos, acordei estremunhado e espremido pelas eufóricas meiguices do meu pai. Chegara de Lisboa e trazia embrulhado de presente um minúsculo insuflável encarnado que (mal ele sonharia) me proporcionou uma das melhores férias de sempre. Eu encaixava que nem uma luva no barquito, que com as palmas das mãos remava com destreza. Na minha imaginação, possuía um autêntico veleiro com o qual alcancei a Índia, cheguei a África e ao topo do mundo. Tirarem-me da água é que era uma carga de trabalhos.
Ano após ano fui aprendendo a conhecer as águas e as marés daquele rio, que cheguei a atravessar a nado muitas vezes. E recordo com saudade as vezes que passeava orgulhoso ao lado do meu pai no seu Volkswagen aos abanões pelo meio das dunas dos Aivados. E havia o nosso guia Jacinto, um pescador autóctone que auxiliava o meu pai em façanhas piscatórias, e que nos acompanhava no Canal à lota do peixe. No último ano que passámos juntos nessa aldeia alentejana, meu pai comprou uma velha barca que deixou à guarda do Jacinto, para um imprescindível restauro. Depois do 25 de Abril, ele não voltou a Vila Nova, e eu nunca mais soube o que se passara com o nosso barco, com o qual tenho a certeza ambos sonhámos divertidas aventuras e passeios numas férias que jamais aconteceram. Talvez por mero pudor, nunca falámos do assunto.
Hoje, por lealdade e caturrice ainda reservo todos os anos uma parte das férias com a família em Milfontes, um destino que afinal se tornou numa pequena selva de betão, paredes-meias com dois enormes parques de campismo. Contra isso vale-nos uma casa que alugamos de costas para a vila e sobranceira ao rio, onde nos podemos abstrair da feira que fervilha lá atrás, e de noite ouvir o chapar dos barcos na água ou uma cigarra a trinar. E depois há as dunas e ondas do Malhão, os miúdos tomaram-lhes o gosto. E há os amores e os amigos de Verão que se querem sempre reencontrar, nem que seja só duas semanas para o ano que vem.