Deus o faça um homem de bem
Luiz Gonzaga de Lancastre e Távora (1946)
Nasceu no dia 8 de Fevereiro de 1937 às 8 horas e 5 minutos da manhã. Na casa de seus pais, Calçada da Estrela 129 2º andar. Assistiram ao seu nascimento D. Adriana Abrantes, D. Isabel Ulrich C. Pereira e Beatriz Nunes Vieira. O médico foi o Prof. Dr. Francisco Gentil.
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Presentes do Baptizado
Avós deram 500$00
Marinha – uma medalha e o fio de ouro
Padrinho – um copo de prata
Pai – um alfinete de ouro
Tia Isabelinha – um challe
Tia Luizinha – dois casacos
Tobin (?) – um lindo challe azul e branco
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- Luiz Gonzaga foi baptisado na igreja de Santos; no dia 13 de Fevereiro de 1937. Madrinha D. Cecília Vamzeler de Castro Pereira e Padrinho D. Pedro de Lancastre e Távora, Conde de Alvor.
No dia 9 de Março estava bastante constipado e mandamos vir o médico. Não lhe achou nada de especial, mandou-o purgar. Fez bastante e feito.
No dia 10 de Março voltou o Fernando. Nada de cuidado.
Abril de 1937
O Luiz já dá os seus passeios e já foi à Ameixoeira ver a bisavó que o adorou. Tem ido à rua de S. João da Mata várias vezes, duas vezes à rua do Prior. Continua dormindo bem de noite, mama 6 vezes em 24 horas, está sempre bem disposto e alegre. No dia 10 deu o seu primeiro passeio de carrinho. Dormiu todo tempo. No dia 30 rio alto pela primeira vez devido ao espirito da sua tia Luiza.
Março de 1937
No dia 8, dia em que fez 3 meses, pôz se de curto e foi passar o dia à rua de S. João da Mata. Tirou vários retratos.
Julho de 1937
No dia 8 de Julho foi para Cintra, para passar o Verão. Foi de automóvel, dormio quasi todo o caminho. Parece que se dará bem, já está com óptima cor, e tem passado todo tempo no jardim. A primeira semana augmentou 125 gramas. Conhece bem a sua mãe.
Agosto de 1937
Continua sendo um bebé de reclame. Ainda só mama, já pesa mais de 9 kilos. Tem passeado todos os dias, e em toda parte é muito admirado. Está muito mais bonito e enche de vaidade a sua mãe. Já gosta de roer uma côdea de pão, tem bastante mau génio, já se senta só e desamparado. Continua sendo um perfeito careca.
No dia 14 tomou a sua 1ª papa, a primeira foi feita por sua mãe mas tendo ficado rala demais não gostou e cuspiu-a toda, teve de mamar. À tarde a sua tia Isabelinha fez uma papa melhor que ele comeu e gostou imenso. No dia 13 foi passar o dia a uma praia, à Praia Grande, gostou muito e esteve bem disposto.
Setembro de 1937
Continua um amor. Tem já mau génio e bate palminhas. Teve uma grande constipação, diminuio uma semana 155 gramas. No dia 27 deste mez andou pela primeira vez ao colo do seu pai, gostou. Já come duas papas por dia e tem um pouco de cabelo mas muito pouco.
Outubro de 1937
Na noite de 4 para 5 deste mez rompeu o primeiro dente! Veio sem grande massada, apenas se tem notado que mete tudo na boca e rabuja mais um pouco talvez. Continua a primeira creança do mundo. Na noite de 9 para 10 apareceu o segundo dente, também quasi sem se dar por isso. Continua bom, com 8 meses pesa 10.625kg.
Dezembro de 1937
De volta em Lisboa o Luiz depois de ter estranhado os primeiros dias um pouco aclimatou-se e passou de novo a ser a creança primeira do seu século. Tem mais dois dentes de cima que nasceram no mês de Novembro. Tem sido um pouco mau de noite. Está desmamado de todo desde o dia 12 de Novembro. Não custou nada a desmamar, antes pelo contrário. Esteve uns dias com pouco apetite mas agora come muito bem. A sua avó materna deu-lhe um par de botas no dia 3 de Novembro, e ele gostou muito. A Carmo Castro Pereira trouxe-lhe de Paris um elegante traje de esquimaux azul claro com que ele fica de se lhe tirar um retrato. Quando está bom tempo passa as manhãs no carrinho no terraço ao sol e gosta imenso de ver os cães dos vizinhos e os pombos. Adora ver cavalos. É um encanto para os nós todos. Tem uma preferência marcada pela sua irmã Maria João.
Dezembro de 1939
O Luiz, de quem não se tem aqui escripto há muito tempo, está um rapagão grande e gordo. É loiro não muito claro, tem olhos castanhos escuros e o cabelo todo aos caracóis. Está um amor, engraçadíssimo. Fala o peor possível, uma linguagem quasi incompreensível, a não ser eu ninguém quasi o entende mesmo, até aos dois anos pode dizer-se que não dirio uma palavra. Tem um genio péssimo, é bastante estragado. Temos cá desde que ele tinha 6 mezes uma senhora (D. Lucília) que toma conta dele que o adora e ele adora a ela e chama-lhe Lóló.
Gostou bastante quando nasceu a irmã mais pequena e não mostra ter ciúmes nenhuns. Faz-lhe as maiores festas. As manas grandes gostam imenso dele e rabiam-no o mais possível.
Continua sendo o encanto de todos cá de casa.
Novembro de 1943
Há muito que nada se escreve a respeito do herói deste livro. Já está um rapagão grande mas com pouco juízo. Tem sido um esplendido exemplar (como diz o Avô d’Orey). Tem uma fértil imaginação e inventa muitas histórias que divertem toda a gente. Há um pouco menos de um ano deu a sua primeira lição. Agora já estuda na escola, no Colégio Padre António Vieira. Gosta imenso mas faz-me a maior falta a mim cá em casa (Teve um irmão que nasceu em Junho passado). Adora o irmão pequenino [Miguel], que por sua vez lhe acha imensa graça.
Teve um verdadeiro desgosto quando lhe morreu a irmãzinha Leonor. Ainda hoje todas as noites fala nela nas suas orações.
Tem bom coração é generozo, mas tem mau génio, e é um pouco imaginativo demais, defeito que bem combatido deve passar-lhe. É esperto e aprende com certa facilidade, mas é um pouco trapalhão nos seus cadernos.
Deus o faça um homem de bem.
Maria Emília Casal Ribeiro Ulrich de Lancastre e Távora
Do diário do bebé.